|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
MARCOS NOBRE
Sarney e
o Real
O REAL faz 15 anos amanhã. É
o aniversário de uma estabilização econômica e de um
novo pacto político que perduram
até hoje.
É também o aniversário da quarta vida política de José Sarney. Sim,
porque o Sarney pós-Real é produto direto do arranjo político firmado em 1994 por FHC, ao qual Lula
deu prosseguimento.
Sarney tomou o posto de um oligarca do Maranhão na década de
60 e deu-se bem como preposto da
ditadura militar por 20 anos. Na
transição morna e errática da redemocratização, acabou presidente.
Enxovalhado ao fim de seu governo, recolheu-se à política regional
até meados dos 90, quando renasceu para a política nacional com o
primeiro governo FHC. Continuou
no mesmo jogo sob Lula.
O acordão do Real consistiu em
ajustar o país à globalização (como
se dizia na época) com o menor
prejuízo possível aos políticos estabelecidos, especialmente aos
sobreviventes da ditadura e arrivistas da redemocratização. FHC
tratou de isolar um certo núcleo de
governo da disputa suicida das forças políticas e arbitrou a disputa
em torno da divisão do butim público restante.
Nesse modelo, acontecem muitas vezes escaramuças por quinhões dos despojos públicos. Foi
assim no caso da disputa entre Jader Barbalho e ACM, que se arrastou do final de 2000 até a renúncia
de ACM ao mandato, em maio de
2001, seguida pela renúncia de Jader em outubro do mesmo ano.
Lula abraçou definitivamente
esse modelo herdado de FHC em
2005, no auge do episódio do
"mensalão". Desde então, enfrentou oito meses de crise com Renan
Calheiros, em 2007. E a crise Sarney já tomou mais de quatro meses
de 2009.
A frequência, duração e gravidade das crises deixam mais do que
evidente que o problema é estrutural e que o acordão do Real se tornou insustentável sob todos os aspectos. Ao mesmo tempo, já ficou
claro também que a reforma do sistema de representação política não
será realizado pelo próprio Congresso. Mesmo a chance de que as
eleições de 2010 possam fazer o
serviço parece baixa, já que o problema é mesmo estrutural.
Com todas as ressalvas que se
pode fazer -e elas são muitas-, a
única possibilidade de mudança
parece estar hoje em um Judiciário
apoiado por iniciativas de peso da
opinião pública. O caminho mais
curto seria garantir que investigações como a da Operação Castelo
de Areia da Polícia Federal prossigam, aprofundem-se e atinjam de
fato todos os políticos envolvidos.
Porque Sarney vai sair, mais cedo ou mais tarde. Mas o modelo
político brasileiro que o produziu
está apenas à espera da sua próxima crise.
nobre.a2@uol.com.br
MARCOS NOBRE escreve às terças-feiras
nesta coluna.
Texto Anterior: Rio de Janeiro - Carlos Heitor Cony: Modos e modas Próximo Texto: Frases
Índice
|