|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
CARLOS HEITOR CONY
Modos e modas
RIO DE JANEIRO - Não se trata
de faixa etária, mas de ouvido mesmo. Abrindo-se as exceções de praxe entre os admiradores de Michael
Jackson, o gostar ou não gostar de
suas músicas é uma questão de hábito -fica difícil classificá-lo como
músico. Sobram-lhe as letras, algumas muito boas, e, sobretudo, a sua
dança -e desde logo afirmo e reafirmo que ele é superior a Fred Astaire, até então o maior bailarino do
audiovisual de nossa era.
Astaire era um romântico, quase
sempre apoiado em partners estupendas, como Ginger Rogers, Cid
Charisse e outras do mesmo naipe e
das mesmas pernas. Era elegante e
tinha humor. Gene Kelly era um coreógrafo de talento, musculoso demais para compor um bailarino nobre. Michael Jackson pertence à categoria dos "possuídos" -e houve
quem um dia chamou Nijinski de
"possuído". Inventou uma expressão corporal que transcende a expressão musical. Muitas vezes sobra-lhe apenas a silhueta, como em
Chaplin -outro gênio da expressão
corporal.
O detalhe da bengalinha, dos farrapos e do chapéu de coco, em Chaplin, tem equivalentes no mocassim e nas meias brancas de Michael
Jackson -um detalhe que poderia
parecer cafona, mas nele é marca de
uma personalidade fora de série.
Quanto à música, repito que é
uma questão de ouvido. Há gente
incapaz de distinguir um Vivaldi de
um Bach, um Debussy de um Ravel,
um Verdi de um Puccini -embora
sejam completamente distintos e,
em alguns casos, antagônicos.
No meu caso, ainda adolescente,
tive dificuldade para distinguir um
canto gregoriano do quarto modo
de um outro de modo diferente. Depois de Elvis Presley, com sua bela
voz abaritonada, e dos Beatles, com
seu assombroso repertório, raramente percebo as maravilhas que o
rock e a música pop me oferecem à
saciedade.
Texto Anterior: Brasília - Eliane Cantanhêde: Febre alta Próximo Texto: Marcos Nobre: Sarney e o Real Índice
|