São Paulo, sexta-feira, 30 de julho de 2004

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BC EMPAREDADO

A ata da reunião deste mês do Comitê de Política Monetária (Copom) não deixa dúvidas de que o Banco Central se encontra emparedado entre as pressões inflacionárias em curso e as metas de inflação que é obrigado a cumprir. Há temores não apenas de que a inflação ameace o teto de 8% estabelecido para este ano, mas que o objetivo de 2005, recentemente confirmado em 4,5%, revele-se por demais ambicioso -como analistas já haviam previsto e esta Folha alertado.
Sendo assim, o Copom anuncia que irá manter a taxa Selic em 16% ao ano "por um longo período de tempo" e chega a acenar com a possibilidade de assumir uma postura "mais ativa" em relação aos juros -ou seja, aumentá-los a depender da evolução do cenário. Parecem, portanto, praticamente nulas as chances de os juros serem cortados até o fim do ano, assim como são improváveis aumentos da taxa Selic pelo menos até as eleições municipais. Imobilizado nessa camisa-de-força, resta ao BC esperar que a manutenção da Selic em 16% permita, como diz a ata, um "controle benigno da inflação".
As preocupações do Copom quanto à inflação são de duas ordens. Em primeiro lugar, teme os efeitos sobre os preços ao consumidor das altas do petróleo e de algumas commodities, que têm elevado os custos das empresas. Em segundo lugar, a autoridade monetária receia que os investimentos sejam insuficientes para evitar gargalos de produção e desequilíbrios entre oferta e demanda, ameaçando a tão propalada sustentabilidade do crescimento.
O quadro, de fato, é preocupante. Do ponto de vista dos instrumentos institucionais, está claro que o sistema de metas de inflação merece ser aperfeiçoado para que a política monetária possa responder de forma mais racional a choques de oferta, como a alta dos combustíveis, e a aumentos de preços administrados, como os das tarifas públicas.
Já foram levadas a debate propostas no sentido de alongar o período de cumprimento das metas e de rediscutir a composição do índice que lhes serve de base. O governo, no entanto, tem ignorado a questão, talvez acreditando que sua credibilidade se fortalece ao anunciar metas ambiciosas no intuito de constranger os agentes econômicos a segui-las. Seria prudente, no entanto, considerar que essa aposta pode ser perdida, seja ao ficar patente o irrealismo dos objetivos fixados, seja ao ver-se o BC compelido a determinar nova rodada de elevação dos juros, com os conhecidos efeitos danosos para a produção, o emprego e a dívida pública.
Juros altos contribuem exatamente para dificultar os necessários investimentos na ampliação da capacidade do setor produtivo e para alimentar o círculo vicioso que, em benefício de distorções rentistas, impede o país de ingressar numa trajetória de crescimento expressivo e sustentado.


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