São Paulo, sábado, 30 de julho de 2011

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Tensão cambial

Intervenção abrangente do governo no mercado futuro do dólar suscita dúvidas e revela muita ansiedade com valorização inevitável do real

O governo surpreendeu o mundo das finanças, nesta semana, ao intervir de forma mais pesada que o usual no mercado de câmbio.
Depois de várias tentativas malsucedidas de conter a valorização do real, por meio de impostos e limites a entradas de capital de curto prazo, desta vez o alcance foi mais abrangente. Na mira das medidas entrou, como alvo principal, o mercado de derivativos.
Esses contratos de câmbio permitem fazer apostas na variação da taxa, com pequeno desembolso imediato. O mercado consegue assim "alavancar-se", ampliando o valor negociado em relação ao mercado físico de moeda, o que dá margem para especulação.
No início da semana havia 962 mil contratos de dólar em aberto na bolsa, equivalentes a US$ 48 bilhões. Em comparação, os compromissos de venda dos bancos no mercado à vista, em meados do mês, eram de US$ 7 bilhões.
Os derivativos também são usados por empresas para se proteger da exposição cambial em operações de comércio exterior e endividamento em moeda estrangeira, na medida em que fixam a cotação do câmbio com que o compromisso futuro será liquidado.
O governo instituiu a cobrança de 1% de IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) sobre a posição vendida em derivativos. Também deu ao Conselho Monetário Nacional o poder de elevar a alíquota para até 25% e interferir nas condições das negociações.
Pela primeira vez, a intervenção atinge, além de investidores estrangeiros, todos os participantes locais, incluindo bancos, empresas e fundos de investimento.
Uma das consequências da ação do BC é encarecer os custos da proteção cambial ("hedge") para empresas com contas a pagar e a receber em moeda estrangeira. Além disso, a cobrança traz problemas operacionais, o que levou o governo a adiar seu início para 5 de outubro. Com as muitas dúvidas, abre-se um espaço preocupante para contestações judiciais.
Fica a desconfiança de que nem todo o cuidado foi tomado em antecipar efeitos colaterais. O esforço para conter a valorização merece apoio, mas é preciso uma estratégia menos voluntarista (para não dizer caótica). Nada pior que adicionar insegurança jurídica à falta de clareza nas políticas.
As causas da valorização do real não derivam só de fatores internos, como a alta taxa de juros e a política de crédito e os gastos públicos. Nestes casos, o governo deveria estar atuando com mais vigor. Quanto ao cenário externo, o Planalto deve conter a ansiedade.
Com o crescimento anêmico dos países ricos e a abundância de capital ocioso, será difícil isolar o país da tendência global de desvalorização do dólar e estancar a torrente dessa moeda para locais com melhores perspectivas de rendimento, como o Brasil.


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