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Tensão cambial
Intervenção abrangente do governo no mercado futuro do dólar suscita dúvidas e revela muita ansiedade com valorização inevitável do real
O governo surpreendeu o mundo das finanças, nesta semana, ao
intervir de forma mais pesada que
o usual no mercado de câmbio.
Depois de várias tentativas malsucedidas de conter a valorização
do real, por meio de impostos e limites a entradas de capital de curto prazo, desta vez o alcance foi
mais abrangente. Na mira das medidas entrou, como alvo principal,
o mercado de derivativos.
Esses contratos de câmbio permitem fazer apostas na variação
da taxa, com pequeno desembolso imediato. O mercado consegue
assim "alavancar-se", ampliando
o valor negociado em relação ao
mercado físico de moeda, o que dá
margem para especulação.
No início da semana havia 962
mil contratos de dólar em aberto
na bolsa, equivalentes a US$ 48
bilhões. Em comparação, os compromissos de venda dos bancos
no mercado à vista, em meados do
mês, eram de US$ 7 bilhões.
Os derivativos também são usados por empresas para se proteger
da exposição cambial em operações de comércio exterior e endividamento em moeda estrangeira,
na medida em que fixam a cotação
do câmbio com que o compromisso futuro será liquidado.
O governo instituiu a cobrança
de 1% de IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) sobre a posição vendida em derivativos. Também deu ao Conselho Monetário
Nacional o poder de elevar a alíquota para até 25% e interferir nas
condições das negociações.
Pela primeira vez, a intervenção
atinge, além de investidores estrangeiros, todos os participantes
locais, incluindo bancos, empresas e fundos de investimento.
Uma das consequências da
ação do BC é encarecer os custos
da proteção cambial ("hedge")
para empresas com contas a pagar
e a receber em moeda estrangeira.
Além disso, a cobrança traz problemas operacionais, o que levou
o governo a adiar seu início para 5
de outubro. Com as muitas dúvidas, abre-se um espaço preocupante para contestações judiciais.
Fica a desconfiança de que nem
todo o cuidado foi tomado em antecipar efeitos colaterais. O esforço para conter a valorização merece apoio, mas é preciso uma estratégia menos voluntarista (para
não dizer caótica). Nada pior que
adicionar insegurança jurídica à
falta de clareza nas políticas.
As causas da valorização do
real não derivam só de fatores internos, como a alta taxa de juros e
a política de crédito e os gastos públicos. Nestes casos, o governo deveria estar atuando com mais vigor. Quanto ao cenário externo, o
Planalto deve conter a ansiedade.
Com o crescimento anêmico
dos países ricos e a abundância de
capital ocioso, será difícil isolar o
país da tendência global de desvalorização do dólar e estancar a torrente dessa moeda para locais
com melhores perspectivas de
rendimento, como o Brasil.
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