São Paulo, sexta-feira, 30 de agosto de 2002

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INÉRCIA PERVERSA

A dívida pública encerrou julho em valor correspondente a 61,9% do PIB -o maior nível da história. Em relação aos 57% do PIB apurados no final de junho, a alta foi significativa. O Banco Central, que divulgou a informação, se apressou em esclarecer que o resultado adverso se deveu basicamente ao fato de a cotação do dólar ter encerrado o mês passado em valor muito alto (R$ 3,428). Como a parcela da dívida cujo valor é atrelado ao dólar é contabilizada pela cotação do final do mês, isso "inflou" os números.
Em agosto, segundo o BC, a dívida deverá cair, pois o dólar deverá se situar, no final do mês, em cotação inferior à do final de julho. Esse prognóstico, possivelmente correto, não deveria obscurecer a constatação óbvia de que a alta da dívida não é um movimento conjuntural, mas sim uma tendência presente há vários anos. Por o fenômeno preocupa.
A dívida pública correspondia a 30,4% do PIB no final de 1994. É sabido que parte da alta observada desde então foi apenas contábil, pois correspondeu ao reconhecimento de passivos preexistentes ("esqueletos"). Mas a maior parte da alta da dívida foi real e, pior, não teve como contrapartida uma expansão proporcional dos investimentos públicos.
A alta da dívida é, portanto, um fenômeno basicamente financeiro, ligado ao baixo dinamismo da economia, aos juros elevados e à crescente dolarização do passivo público.
Essa dolarização corresponde, em grande medida, a uma socialização do risco cambial. O expediente de vender títulos cambiais permitiu que fortes altas do dólar não fossem acompanhadas por uma onda de quebras de empresas endividadas no exterior. Mas, em contrapartida, a dívida pública se tornou muito sensível à valorização do dólar.
A inércia perversa que alimenta a alta da dívida (e fomenta receios entre os credores do setor público) tem de ser rompida. Para reter sua credibilidade, fugindo de ajustes traumáticos que desvalorizem a dívida, o próximo governo precisa recolocar a economia na senda do crescimento.


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