São Paulo, sexta-feira, 30 de agosto de 2002

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JOSÉ SARNEY

Crescer ou morrer

A crise cambial, a segunda em menos de cinco anos, os reflexos internacionais de alguns índices vermelhos da economia do país, as altas taxas de risco, o pedido de socorro ao Fundo Monetário Internacional, tudo isso levou a economia ao centro do debate sucessório e remeteu ao banco de reservas o mais dramático de todos os temas de interesse dos brasileiros, a violência, indicado nas pesquisas qualitativas como o primeiro.
Diz-se que a violência somente ocorre e prospera devido à ineficiência do aparato policial, à inexistência de uma justiça penal ágil, à falta de um sistema penitenciário moderno e de leis mais duras, a baixos salários dos policiais e à ausência de recursos humanos qualificados na área. Tudo isso é verdade.
O resultado é uma sociedade de pessoas encarceradas em suas casas e dominadas pelo sentimento do medo. Juscelino dizia que Deus o havia poupado desse sentimento, mas se contradisse ao afirmar que tinha medo de ter medo. Hoje o que temos todos é o medo de não ter medo. Nesse clima, as recomendações dos experts em defesa pessoal são para não reagir e aceitar o assalto, o sequestro ou o estupro para evitar a morte. A insegurança deforma e modifica as condutas e apodrece a sociedade e as pessoas. "Viver não é brincadeira, não", diz a canção popular. Sobreviver, então, é terrível. Os valores da vida se esgarçam.
Onde está a fonte da violência? Uns falam na pobreza, outros, na predisposição de determinadas pessoas para a prática do crime -quase uma doença, uma patologia do comportamento. Todas as hipóteses devem ser consideradas, inclusive a "ocasião faz o ladrão", do ditado popular.
Quero apontar uma causa na raiz de todas essas mazelas: a falta de crescimento econômico. O país está estagnado há uma década. E as estatísticas de violência sobem quando não há crescimento. Sem crescimento, o desemprego aumenta, a riqueza não circula e desaparecem as oportunidades. E as novas gerações, que deveriam ingressar no mercado de trabalho, ficam frustradas e caminham sem horizontes para a marginalidade, para o crime, para os vícios, para as drogas. Não há espaço para esperança nem para utopias.
A ligação entre a pobreza e a violência está ausente do debate sucessório. Violência não se combate sem que se ataquem as causas estruturais que a determinam. Sem crescimento econômico não há trabalho, há desemprego. A estagnação da economia corrói as bases da sociedade.
E como fazer crescer a economia e a renda das pessoas? O Estado, sempre o grande investidor em países em desenvolvimento, está exangue. A poupança interna é baixa, e os investimentos externos mínguam.
Sem crescimento, é impossível resolver os problemas de educação, de saúde, de emprego, de segurança.
Crescer e como crescer, eis a questão. Não é exportar ou morrer, é crescer ou morrer.
Se não retomarmos o desenvolvimento econômico nem diminuirmos o desnível de renda e se persistir o desemprego, só nos restarão tempos difíceis. Aí, teremos de apelar para a filosofia dos pára-choques de caminhão: "Em tempo de crise, urubu come goiaba verde". E aí, "se parar, o Bush pega; se correr, o Bush come".


José Sarney escreve às sextas-feiras nesta coluna.



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