São Paulo, domingo, 30 de agosto de 2009

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Capital patrocinado


Na falta de alavancas para poupança privada, governo aumenta peso em grandes empresas de modo preocupante

ESTÁ PRESTES a surgir mais um gigante industrial patrocinado pelo governo, agora no setor petroquímico. A provável compra da Quattor pela Braskem, mediante o apoio da Petrobras, que detém participações acionárias em ambas as companhias, resultará em monopólio da produção de resinas no mercado doméstico.
Não se trata de relâmpago em céu azul. Nos últimos três anos, intensificou-se a formação de conglomerados, na maior parte das vezes por meio de operações que contaram com dinheiro ou aval do governo. Reconfiguram-se, desse modo, as regras do jogo, o poder econômico e o controle do capital em setores como alimentos, siderurgia, logística, energia, finanças e telefonia.
A atribulada abertura da economia brasileira nas últimas décadas, na direção de práticas consagradas de mercado, não prescindiu do apoio público. O BNDES e os fundos de pensão estatais participaram de praticamente todas as grandes privatizações da era FHC. Se o Estado deixou de dirigir as empresas, o que sem dúvida redundou em avanço, tornou-se uma espécie de "acionista de última instância" de grandes companhias.
Era de esperar, contudo, que esse fosse apenas um estágio no processo de afastamento paulatino do governo em relação à esfera das decisões empresariais. Mas o país, de lá para cá, não desenvolveu os meios para viabilizar tal emancipação.
O substrato que poderia ensejar o enraizamento do mercado de capitais -a multiplicação de fundos de pensão voltados à poupança de longo prazo- pouco evoluiu. Sugados por uma máquina voraz de gastar, e atraídos por juros fora do contexto internacional, os capitais disponíveis fluíram desproporcionalmente para financiar a dívida pública.
O circuito dos ganhos generosos com risco desprezível dos títulos governamentais também aprisionou e viciou o sistema bancário. Faz pouquíssimo tempo que os grandes bancos, públicos e privados, começaram a impulsionar seus empréstimos para o setor privado. Ainda assim, concentram as operações em modalidades de curto prazo, como o crédito ao consumo e ao giro das empresas.
Não foram superados obstáculos à alavancagem da poupança das famílias, como os juros tabelados da caderneta, os compulsórios bancários exagerados, a obrigação de destinar créditos para este ou aquele setor, a falta de estímulo à proliferação de fundos de pensão. O caixa das companhias, o volátil mercado externo -ao qual só um punhado delas tem acesso-, o BNDES, tradicionais fundos de pensão controlados pelo governo e a Petrobras permanecem as principais fontes de capital para grandes projetos e grandes fusões.
Não é sem mal-estar que se constata o novo ciclo de proliferação de capitais e créditos estatais em grandes empresas. Quando o poder econômico e o político se mesclam dessa maneira, o controle das decisões de Estado tende a distanciar-se dos cidadãos -e o sucesso nos negócios passa a medir-se menos pelo mérito de iniciativas empresariais e mais pelo grau de aproximação com os governantes.


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