São Paulo, segunda-feira, 30 de agosto de 2010

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Reforma possível

Reformulação do sistema tributário pode ser iniciada com medidas pontuais, mas não será viável sem redução do custo do Estado brasileiro

Entre as reformas necessárias para assegurar o crescimento de longo prazo da economia brasileira, a tributária é fundamental. O sistema brasileiro, formatado em 1965, sofreu uma série de remendos ao longo do tempo e deixou de atender a requisitos básicos de eficiência e equidade.
Um dos principais problemas do regime atual é sua extrema regressividade, que pune os mais pobres. O Brasil arrecada 35% do PIB, muito acima da média dos países em desenvolvimento, mas não tem base de renda ampla o suficiente para gerar essa carga.
A saída encontrada é abusar de contribuições e impostos cumulativos que incidem sobre a folha de pagamento, o faturamento das empresas e o consumo de bens e serviços. No geral, a chamada tributação indireta representa quase a metade da receita tributária no país, contra média mundial inferior a 40%.
Se os impostos incidissem principalmente sobre a renda (trabalho e lucros) e o patrimônio, ficariam minimizadas as distorções. É assim que ocorre nos países mais desenvolvidos, que arrecadam duas vezes mais que o Brasil com Imposto de Renda (média de 15% do PIB, contra cerca de 7%, no caso brasileiro).
O resultado é uma tributação final altíssima sobre o consumo, inclusive o de primeira necessidade, que pode representar até mais da metade do preço final do produto. É aí que reside a grande injustiça do sistema, infelizmente invisível para a maioria: os mais pobres pagam proporcionalmente mais.
É preciso, aliás, que a população conheça o quanto gasta em tributos. A publicação do valor dos impostos na nota fiscal da compra é proposta antiga e necessária, mas nunca implementada.
O nó górdio que tem bloqueado todas as tentativas de reforma é a dificuldade de coordenação entre os entes federativos. A complexa legislação do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) e a guerra fiscal entre os Estados tornam muito difícil o redesenho do sistema para unificar o cipoal de impostos indiretos em um único IVA (Imposto sobre Valor Agregado) nacional, que sempre foi uma prioridade dos frustrados ensaios de reforma.
Ressalte-se que essa unificação, se buscada isoladamente, deve ser vista com cautela, pois na prática poderia resultar em tributo com alíquota proibitiva.
O que fazer então? A experiência demonstra que uma grande reforma corre o risco de esbarrar em problemas políticos insolúveis. Por outro lado, não se deve abdicar de mudanças ambiciosas, mesmo que obtidas de modo incremental, com avanços que se acumulem no tempo.
Um aperfeiçoamento dentro da atual moldura legal, que não implique mudança na Constituição, seria um bom começo. A real eliminação da tributação sobre exportações e bens de capital é prioritária, em lugar da proliferação de regimes especiais e de créditos nunca pagos que vemos hoje. O mesmo vale para um programa de desoneração da folha salarial.
Mas nenhuma mudança bastará enquanto o Estado brasileiro não couber no PIB. A carga excessiva decorre do tamanho da despesa, razão primeira das distorções que se acumularam.


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