São Paulo, domingo, 30 de agosto de 1998

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Collor e FHC

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - Como os verbos e os pederastas, os presidentes da República podem ser divididos em ativos e passivos. Incluo entre os ativos: Floriano, Bernardes, JK, Geisel e Collor. Entre os passivos: Deodoro, Washington Luiz, Dutra, Jango, Figueiredo e FHC. (Vargas é caso à parte.)
Fiquemos nos dois mais recentes. Collor foi dos mais ativos. Deu régua e compasso às elites brasileiras. Desde a gravata ao uísque, passando pelo cooper e pelos slogans gravados em camisetas, foi um Petrônio Árbitro dos entendidos.
Tão ativo que quis enriquecer depressa, conjugou na voz ativa um esquema de corrupção que mobilizou as elites. No outro lado da corda, foi ativo em iniciar o desmanche de uma mentalidade isolacionista que, entre outras coisas, produzia carroças na indústria automobilística.
FHC é o mais passivo de todos. Será reeleito com 60%, 70%, 80% de votos porque soube administrar em proveito próprio os mananciais subterrâneos que formam o poder. Como presidente, não conduz. É conduzido pelo vento que sopra mais forte.
Não chega a ser um ditador formal (o poder verdadeiro não aprecia ditadores que lhe fazem concorrência). Necessitado do sufrágio popular, criaram para ele um clone do desgastado cabo eleitoral de antigamente: o real. Evidente que o poder aceitou a barganha: não custa manter uma moeda artificial, desde que ela dê tranquilidade ao gigantesco cassino neoliberal.
Nos tempos coloniais, a casa-grande garantia a cesta básica da senzala: era um caldeirão com mandioca, farinha, feijão, abóbora e um pouco de charque. Mantinha a mão-de-obra em pé e conformada. Havia o pelourinho para impor o medo, como hoje há o desemprego.
Daí que compreendo o seu discurso de candidato: homem de confiança do verdadeiro poder (que é anônimo e protegido pelo sigilo bancário), ele reconhece que não fez o que queria porque se fizesse poderia ter o destino de Collor.



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