São Paulo, domingo, 30 de agosto de 1998

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O petróleo e a garra brasileira

ANTONIO ERMÍRIO DE MORAES

Há muito tempo que eu acalentava a vontade de visitar uma plataforma de extração de petróleo. Realizei o sonho na semana passada. Depois de chegar ao Rio de Janeiro e viajar uma hora em um helicóptero robusto de 24 lugares, cheguei a uma delas, na bacia de Campos.
Os impressionantes números do desempenho do Brasil no campo do petróleo são bastante conhecidos. Mas uma coisa é lidar com estatísticas frias. Outra é testemunhar ao vivo a força da inteligência dos nossos irmãos brasileiros. A quantidade de conhecimentos acumulados naquele complexo engenho é fantástica.
Extrair petróleo do fundo do mar não é novidade. Muitos povos fazem isso há várias décadas. Mas perfurar um poço de 3.500 metros de profundidade, depois de vencida uma lâmina d'água de mais de mil metros, é uma obra que dá orgulho de ser brasileiro.
A complexidade da tarefa é reconhecida no mundo inteiro e os seus autores já foram justamente agraciados com a mais alta homenagem que se pode prestar à criatividade humana, que é a concessão do prêmio "Offshore Technology Conference Award".
Numa hora em que se fala tanto em Bolsa, juros, especulação e quebradeira, dá gosto ver milhares de talentosos funcionários cuidando daquilo que é mais fundamental para o funcionamento do lado real da economia -a energia.
Há menos de 20 anos, o Brasil gastava o correspondente a 80% de suas exportações para comprar petróleo. Hoje, gasta menos de 5%. Isso não ocorreu por milagre. Ao contrário, foi fruto de muita pesquisa e uma enorme competência profissional -sem contar, é claro, os milhões de horas de trabalho, realizadas dia a noite, para fazer saltar a produção diária de petróleo de 300 mil barris, em 1975, para mais de 1 milhão, em 1998. Em poucos anos, com a abertura dos campos de Roncador, produziremos mais 200 mil barris por dia.
Nada disso seria impressionante se as facilidades de extração de petróleo no Brasil fossem correspondentes às do Oriente Médio, onde o ouro negro está praticamente na superfície da terra ou após lâminas d'água de 200 metros. No Brasil, a natureza nos obriga a mergulhar fundo no mar e a montar plataformas e poços que custam perto de US$ 1 bilhão para extrair 100 mil barris por dia.
A engenharia brasileira está de parabéns. Cerca de 70% do nosso petróleo vem do mar. Os que ali laboram merecem o nosso respeito. São pessoas que trabalham em cima de um engenho de alta tecnologia durante 15 dias seguidos, isolados no mar, e com a enorme responsabilidade de garantir fornecimento, segurança, limpeza e proteção ecológica.
Gostei muito do que vi. Se as condições de acesso não fossem tão difíceis, seria tentado a sugerir que todas as nossas crianças e adolescentes passassem por lá para testemunhar o talento dos nossos pesquisadores e a garra dos nossos trabalhadores. Foi pena que, na recente visita do presidente Clinton ao Brasil, o cerimonial tenha preferido levá-lo à escola de samba da Mangueira em lugar de conduzi-lo à bacia de Campos, para ali constatar um pouco da competência brasileira.


Antonio Ermírio de Moraes escreve aos domingos nesta coluna.



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