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CLÓVIS ROSSI
O sonho e o amontoado
SÃO PAULO - De repente, ouço do
cantor e compositor Oswaldo Montenegro, em entrevista para a TV
Gazeta, uma frase que, para o meu
gosto, é uma síntese quase perfeita
para o momento: "Sou do tempo
em que a gente sonhava junto; hoje, sonhar junto é cafona".
Vale para as eleições brasileiras.
A frieza que as cerca reflete, acho, a
falta de sonhos coletivos e o predomínio do individualismo. Essa história de "pai" ou de "mãe", por
exemplo, é típica de relação patriarcal, de cima para baixo, bem
longe do "somos todos iguais/ braços dados ou não" daquela canção
de Geraldo Vandré.
Foi um dos hinos da resistência à
ditadura.
Por falar em ditadura, nunca esqueci de uma frase que os espanhóis usavam muito, nos anos posteriores à morte de Francisco Franco Bahamonde, o ditador que ganhou a guerra civil (1936/39) e que
ficou no poder até morrer, em 1975:
"Contra Franco, vivíamos melhor",
dizia-se.
Viviam melhor, apesar das perseguições, apesar da ditadura, porque sonhavam juntos e era facilmente discernível quem era mocinho, quem era bandido, conforme
o lado que se escolhesse.
As centrais sindicais espanholas
que sonhavam junto com socialistas e comunistas, entre outros, lideravam ontem uma greve geral contra as reformas impostas pelos socialistas, que estão no governo e já
não sonham, rendem-se ao pesadelo imposto pelos mercados.
Lembrei de Vandré por causa da
entrevista que a Globo News anunciava na semana passada e cuja exibição acabei perdendo.
Fui buscar na internet e encontrei uma frase que remete ao início.
Questionado sobre em que país vive, Vandré responde:
"Eu até me atreveria a dizer que
quem não vive no Brasil é a maioria
dos brasileiros. A quase totalidade
dos brasileiros não vive mais no
Brasil. Vive num amontoado".
crossi@uol.com.br
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