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São Paulo, quinta-feira, 30 de outubro de 2003

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VINICIUS TORRES FREIRE

Os muito vivos e os mortos

SÃO PAULO - Pela primeira vez na história, a economia do Brasil cresceria mais que a inflação, dizia Pedro Malan, ministro da Fazenda de FHC, no início de 2001. Não cresceu nada. A profecia malparada de Malan parecia o último prego do caixão de um jeito de fazer política econômica. Mas o governo exumou o cadáver.
Antes que gralhas, corvos e abutres do mercado grasnem: outra política econômica não significa "fora FMI", governo gastar à matroca ou juro baixo em qualquer situação.
O estilo FHC-Malan conjugou intervenção errada no mercado (no câmbio) a negligência com ares liberais (privatização inepta, ausência de política comercial), incompetência crassa (apagão), irresponsabilidade fiscal e incapacidade de negociar reformas que dizia essenciais. Nem se mencionem políticas para desenvolver regiões e pessoas pobres.
Os economistas de Lula congratulam-se por terem calibrado variáveis básicas -gasto público, inflação, juros etc. Parecem avaliar que o país irá crescer sem mais desde que mantida tal calibragem e aprovado o "marco regulatório" (leis que regem o investimento privado). Repetem o franquismo-malanismo de épocas de calmaria. De resto, a calibragem ainda é ruim -vide os juros.
Mas quede a política comercial? A falação sobre "soberania" na Alca não é política comercial. É só política. Qual a política de investimento do BNDES? Nem capitalizado o banco está. Qual é a política para incorporar regiões pobres ao mercado? Como crescer se o governo rapa verbas de ciência e tecnologia? Se nem política de educação tem?
Não convinha rever o sistema de metas de inflação em período de crise. Mas tal modelo serve ao país? O BC não tem autonomia demais para uma agência que quase não presta contas, com sua estrutura política e administrativa tão minguada e politicamente tendenciosa?
No Planalto, começa a festa do "fim da crise". O cadáver dos anos FHC brinda com Lula e ministros. "Na minha pátria,/ onde os mortos caminhavam/ e os vivos eram feitos de papelão" (cortesia de Ezra Pound).


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