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Convite ao tumulto
Presença de Chávez no Mercosul, aceita em comissão do Senado, pode tornar mais instável instituição já fragilizada
AO APROVAR a entrada da
Venezuela no Mercosul, por 12 votos a 5, a
Comissão de Relações
Exteriores do Senado atende às
pressões do Executivo e de lobbies empresariais interessados
no sentido de manter uma política de "boa vizinhança" com o governo de Hugo Chávez.
A decisão, que ainda tem de
passar pelo plenário, expressa o
generalizado interesse governista de afastar do debate qualquer
julgamento sobre o verdadeiro
caráter do regime vigente na
Venezuela.
Como se sabe, a participação
de um país no Mercosul submete-se à chamada "cláusula democrática", instituída em 1998. Eis
que no país de Hugo Chávez não
se instaurou uma ditadura propriamente dita: a ressalva satisfaz os defensores de seu ingresso
no bloco, que acrescentam não
ser o caso de maior aprofundamento na análise dos assuntos
internos daquele país.
Não faltam evidências de que o
sistema político da Venezuela gira em torno dos caprichos e do
histrionismo de um caudilho.
Pode-se argumentar, como é
costume do presidente Lula
sempre que indagado sobre o assunto, que Hugo Chávez foi eleito democraticamente pela maioria da população.
O problema representado pela
presença da Venezuela no Mercosul não se resolve, entretanto,
quando Executivo e parlamentares da base governista se agarram aos fiapos de democracia
que ainda possam ter resistido às
investidas do chavismo. Qualquer que seja o rótulo do regime,
o problema tem outro nome.
Chama-se Hugo Chávez.
São irrealistas os argumentos
de que está em jogo a relação entre Estados -a Venezuela, de um
lado, e os países do Mercosul, de
outro. Os interesses comerciais e
os laços de amizade que aproximam a Venezuela dos vizinhos
no continente persistem. Mas se
as instituições de um Estado se
tornam secundárias diante da
vontade unilateral de um governante, é a respeito deste que
cumpre fazer uma avaliação.
À frente do governo venezuelano, Hugo Chávez se vê desimpedido para realizar expropriações
arbitrárias, romper contratos,
apostar no dissenso, na provocação, na bravata e no tumulto em
qualquer fórum internacional de
que participe.
Com suas ambições de hegemonia sobre o continente, será
Chávez, e não uma Venezuela
abstrata, quem irá dispor de poder de veto sobre as decisões do
Mercosul, caso venha a confirmar-se seu ingresso no bloco.
Os sinais de fragilidade do
Mercosul, por outro lado, acumulam-se de forma preocupante. Nesta semana, para mencionar o caso mais recente, a troca
de represálias comerciais entre
Brasil e Argentina paralisou o
movimento de cargas de vários
produtos, como trigo, peixe e
frutas, nos postos de fronteira.
O ambiente não poderia ser
mais propício para quem, com o
beneplácito irrefletido do Brasil,
quiser atuar pela desagregação
de um bloco fundado para criar
um espaço de desenvolvimento e
democracia no continente.
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