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CLÓVIS ROSSI
O crime e o lusco-fusco
SÃO PAULO - Em meio à enxurrada de análises sobre os ataques dos
últimos dias no Rio de Janeiro, talvez tenha sido do cineasta Cacá
Diegues o melhor resumo, pela
abrangência.
"Não vejo solução a curto prazo
para um problema tão antigo. Há
quanto tempo o Brasil ignora suas
questões mais básicas?"
Tem razão. Se tivesse havido ação
quando o problema não era tão antigo, certamente não se chegaria ao
desalento de não ver solução a curto prazo. Há 30 anos, quando, arbitrariamente, se pode situar o início
da escalada da violência urbana, haveria solução no curto prazo pela
simples e boa razão de que o problema era bem menos grave e bem menos disseminado.
A segunda parte da frase pode ser
aplicada ao conjunto da obra inacabada chamada Brasil. Na economia,
por exemplo, faz um quarto de século que o país cresce mediocremente, sem que se encare de frente
o problema. Antes, era preciso primeiro matar a inflação. Ela morta
(ou ferida de morte), tem o câmbio,
tem os juros, tem a dívida, tem os
gargalos de infra-estrutura, tem a
falta de investimentos públicos
(privados também, embora menor), e por aí vai.
A rigor, a rigor, o Brasil não conseguiu ainda decidir o teor de capitalismo que quer receber nas veias
e, por extensão, o teor de intervenção do Estado que é ainda possível
haver no mundo contemporâneo.
Ficamos sempre no limbo, do que
dá prova, entre tantas outras coisas,
o fato de que o presidente da Câmara dos Deputados é nominalmente
comunista, mas participou alegremente de um governo vigorosamente pró-mercado (na prática),
embora, durante a campanha eleitoral, renegasse as privatizações,
que, vitorioso, passou a adotar gostosamente (nas rodovias federais,
por exemplo).
Nesse lusco-fusco de conceitos e
de idéias, só quem as tem claras é o
crime organizado. Azar nosso.
crossi@uol.com.br
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