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O fato consumou-se
A lógica dos lobbies de gabinete tem de dar lugar à do interesse público
no debate acerca das
regras da telefonia
EM SETEMBRO do ano passado, quando afloravam
as primeiras especulações acerca de uma grande fusão nas telecomunicações
brasileiras -algo vedado pelas
normas do modelo vigente-, o
editorial "Teletrama", aqui publicado, já prenunciava o óbvio
desfecho dessa história.
"É plausível supor que esteja
em curso a velha tática do fato
consumado: desse emaranhado
de transações financeiras, de repente as duas telefônicas brasileiras podem emergir fundidas.
E o Planalto está ansioso para
modificar a legislação que proíbe
tais operações". Passados cinco
meses, o fato consumou-se.
Controladores da Oi (antiga
Telemar, concessionária de linhas fixas no Nordeste, no Norte
e no Sudeste, à exceção de São
Paulo) e da Brasil Telecom (que
atua no Sul, no Centro-Oeste e
em Rondônia, Tocantins e Acre)
informaram ao governo ter chegado a um acordo para a compra
da segunda pela primeira.
O Executivo bem que tentou
agir depressa. O ministro das Comunicações, Hélio Costa, prometeu que instaria a Anatel a
abrir de imediato um processo
para mudar o decreto que proíbe
um grupo de operar em mais de
uma área de concessão. Mas ontem o ministro recuou e vai esperar a publicação do comunicado
oficial pelas duas empresas.
Quando for provocada, a Anatel vai abrir um procedimento
técnico interno e uma consulta
pública sobre o tema, e seu resultado será devolvido ao governo
na forma de sugestão de reformas no chamado Plano Geral de
Outorgas -ou de manutenção da
regra vigente.
É notório que o processo nasce
viciado e que a última preocupação das autoridades e dos interessados no negócio é com o consumidor e a concorrência. Subverteu-se a ordem das coisas:
primeiro deveria haver uma discussão acerca da necessidade ou
não de reformas nas regras da
concessão de serviços telefônicos. Caso se chegasse a um consenso sobre uma nova legislação,
ela então deveria ser implantada
e, apenas depois disso, os rearranjos empresariais ocorreriam.
Do modo como a trama foi armada, não há dúvida de que, nos
bastidores de uma transação estimada em R$ 8 bilhões, o aval do
governo à compra da BrT pela Oi
já foi concedido. Não bastasse o
poder dos lobbies empresariais
envolvidos, grandes fundos de
pensão de estatais, controlados
por militantes petistas, são interessados na operação, pois têm
participação acionária nas duas
empresas. De quebra, o governo
promete resolver uma série de
pendências de outras operadoras e com isso escancara o ânimo
casuísta de sua intervenção.
Resta exigir da Anatel uma
mudança no tratamento do assunto. A truculenta lógica dos
lobbies empresariais e sindicais,
na sombra dos gabinetes, tem de
dar lugar à do interesse público.
É dos defensores da alteração no
"statu quo" o ônus de provar,
com argumentos e estudos, por
que um modelo responsável por
tirar a telefonia do país da idade
da pedra precisa ser modificado.
Até agora nenhuma idéia ventilada por agitadores da mudança foi convincente. Nenhuma
dissolveu o temor de que o consumidor é quem vai arcar com o
custo dessa aventura.
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