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A crise nas urnas
Discurso conservador do republicano McCain, nos EUA, pode encontrar eco numa sociedade individualista e punitiva
A EXPECTATIVA até o fim
de 2007 era a de que o
tema predominante na
campanha presidencial americana seria a ocupação
do Iraque. A partir dessa hipótese e da constatação de que pelo
menos dois terços dos eleitores
rechaçavam a política do presidente George W. Bush nesse aspecto, formou-se opinião quase
consensual de que o candidato
do partido de oposição, o Democrata, seria o favorito.
Dentre os aspirantes do Partido Republicano, do governo, um
parecia com chances quase nulas, por ter sempre apoiado o
presidente nesse tema: o senador John McCain.
No entanto, a diminuição da
violência no Iraque desde dezembro e a emergência de problemas econômicos gravíssimos
e imediatos nos EUA alteraram
muito essa lógica. A preocupação
principal dos eleitores agora é o
que acontecerá com seu bolso,
em decorrência da crise das hipotecas de alto risco e das dificuldades no setor de crédito.
McCain, que já assegurou a indicação como o candidato do
Partido Republicano, nunca foi
um "expert" em economia. Mas,
ao reafirmar com vigor princípios muito conservadores sobre
como lidar com os dilemas
atuais, pode ganhar espaço.
Desde a eleição de Richard Nixon, em 1968, e em particular
após a de Ronald Reagan, em
1980, a maioria dos eleitores nos
EUA tem demonstrado clara
preferência pela ortodoxia capitalista, em especial no que se refere ao papel mínimo do Estado
no campo econômico.
Teses de intervenção estatal
dominantes entre o "New Deal"
de Franklin Roosevelt e a "Grande Sociedade" de Lyndon Johnson foram batidas na urna quando defendidas por candidatos como George McGovern, Walter
Mondale e Michael Dukakis.
Os democratas só reconquistaram a Casa Branca com o discurso muito mais conservador de
Bill Clinton, que na Presidência
equilibrou o orçamento e desmontou grande parte do aparelho assistencialista do Estado legado por Roosevelt e Johnson.
Neste ano, os dois aspirantes à
candidatura democrata, Hillary
Clinton e Barack Obama, prometem ajuda estatal de grande porte para resolver as aflições dos cidadãos assoberbados pela crise.
Mas McCain tem afirmado que
"não é dever do governo salvar
ou recompensar aqueles que
agem irresponsavelmente, sejam grandes bancos ou os que fazem pequenos empréstimos".
Ele argumenta que 55 milhões
de americanos têm hipotecas e
apenas 4 milhões deles não conseguem honrar seus compromissos, porque "compraram casas
que não podiam pagar, apostando que os preços ascendentes facilitariam refinanciamentos
mais vantajosos no futuro".
Clinton e Obama dizem que tal
discurso é irresponsável e pouco
solidário. Mas ele pode encontrar ressonância numa sociedade individualista, conservadora e
punitiva, onde a maioria acha
que cada um responde pelos riscos que resolve correr e o Estado
não tem nada a ver com isso.
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