São Paulo, Quarta-feira, 31 de Março de 1999
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Torneio de indignação

CLÓVIS ROSSI

São Paulo - Logo cedo, um leitor, muito gentil, telefona para desabafar a sua indignação com o asilo concedido pelo Brasil ao ex-presidente paraguaio Raúl Cubas.
De fato, o cenário mostrado na foto da capa desta Folha ontem só reforça o estereótipo de filme B norte-americano, segundo o qual todo delinquente foge para o Brasil (será que é estereótipo mesmo?). Não que Cubas possa, sem julgamento, ser chamado de delinquente, mas que enfrenta pesada acusação em seu país, lá isso enfrenta.
De todo modo, o Brasil parece ter entrado em um torneio de material para indignação. Se eu tivesse que escolher, na Folha de ontem, ficaria com duas outras questões, a saber:
1 - a informação de que o Banco Central apostou -e perdeu- R$ 7,6 bilhões, em janeiro e fevereiro, em seu jogo contra a desvalorização do real.
Nada contra apostas, desde que legais. Mas apostar com "o meu dinheiro, o seu dinheiro, o nosso dinheiro", como já admitiu até o presidente do BC, Armínio Fraga, é insuportável.
Não vai acontecer nada com esses apostadores de dinheiro alheio?;
2 - o artigo do presidente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Dirceu de Mello. Nele, a mais alta autoridade do Poder Judiciário no Estado diz que "chega a ser motivo de orgulho" o fato de o senador Antonio Carlos Magalhães ter apontado apenas quatro casos de irregularidades no Judiciário paulista.
Até entendo o que Dirceu de Mello quis dizer. Para uma corporação de 2.000 juízes, parece de fato pouco terem sido apontadas apenas quatro irregularidades.
Mas é demais dizer que "chega a ser motivo de orgulho" haver irregularidades, uma que fosse, na instituição incumbida exatamente de puni-las.
É um retrato nítido de como o país, em todas as suas instâncias, reduziu o nível de expectativas. Em vez de lamentar que haja irregularidades (não importa quantas), o Judiciário orgulha-se de que sejam poucas as apontadas (podem não ser as únicas, aliás).


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