São Paulo, quinta-feira, 31 de maio de 2007

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CLÓVIS ROSSI

Dizer o indizível

PARIS - Ah, como cansa ver que a esquerda não aprende nunca. Caiu-lhe em cima o Muro de Berlim, mas mesmo assim esses jurássicos personagens insistem em teses neobobas. A mais recente delas, ouvida aqui em Paris da boca de um perigoso esquerdista chamado Nicolas Sarkozy, é a de que "não são só os banqueiros que têm idéias sobre política monetária".
Ufa, como é possível que alguém em seu juízo perfeito seja capaz de contrariar o édito divino pelo qual se atribuiu aos Bancos Centrais e aos mercados que os condicionam o papel único de definir a taxa de juros ou de câmbio? Que terrível arcaísmo esquerdista, não?
O que, você está me dizendo que Sarkozy não é de esquerda nem arcaico, tanto que acaba de se eleger presidente da França e, ainda por cima, proclamando o orgulho de ser direitista e pró-mercado?
Pior ainda: esse rapaz ousou afirmar também que o BC europeu deveria ter como meta não apenas a inflação mas o crescimento e o emprego também. Aliás, os estatutos do Fed (o Federal Reserve, o BC norte-americano) impõem a obrigação de ter um olho na inflação e outro no crescimento. Faz todo o sentido: os mortais comuns vivemos melhor com inflação baixa desde que tenhamos também um emprego decente, o que só o crescimento elevado ajuda a proporcionar.
Sarkozy foi além: em jantar em Bruxelas, com a cúpula européia, defendeu a "preferência comunitária", jargão para dizer que a Europa deveria dar preferência nas suas importações a produtos europeus. Se alguém pensou em trocar "preferência comunitária" por "protecionismo" não errou.
No Brasil, qualquer um que diga coisas parecidas com essas é condenado à fogueira como neobobo, atrasado, jurássico, "cabeça de galinha" e por aí vai. Por aqui, ninguém acusou Sarkozy de nada disso. Vai ver que é por isso que a França é o que é, e o Brasil também.


crossi@uol.com.br

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