|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
CLÓVIS ROSSI
Dizer o indizível
PARIS - Ah, como cansa ver que a
esquerda não aprende nunca. Caiu-lhe em cima o Muro de Berlim, mas
mesmo assim esses jurássicos personagens insistem em teses neobobas. A mais recente delas, ouvida
aqui em Paris da boca de um perigoso esquerdista chamado Nicolas
Sarkozy, é a de que "não são só os
banqueiros que têm idéias sobre
política monetária".
Ufa, como é possível que alguém
em seu juízo perfeito seja capaz de
contrariar o édito divino pelo qual
se atribuiu aos Bancos Centrais e
aos mercados que os condicionam o
papel único de definir a taxa de juros ou de câmbio? Que terrível arcaísmo esquerdista, não?
O que, você está me dizendo que
Sarkozy não é de esquerda nem arcaico, tanto que acaba de se eleger
presidente da França e, ainda por
cima, proclamando o orgulho de ser
direitista e pró-mercado?
Pior ainda: esse rapaz ousou afirmar também que o BC europeu deveria ter como meta não apenas a
inflação mas o crescimento e o emprego também.
Aliás, os estatutos do Fed (o Federal Reserve, o BC norte-americano) impõem a obrigação de ter um
olho na inflação e outro no crescimento. Faz todo o sentido: os mortais comuns vivemos melhor com
inflação baixa desde que tenhamos
também um emprego decente, o
que só o crescimento elevado ajuda
a proporcionar.
Sarkozy foi além: em jantar em
Bruxelas, com a cúpula européia,
defendeu a "preferência comunitária", jargão para dizer que a Europa
deveria dar preferência nas suas
importações a produtos europeus.
Se alguém pensou em trocar "preferência comunitária" por "protecionismo" não errou.
No Brasil, qualquer um que diga
coisas parecidas com essas é condenado à fogueira como neobobo,
atrasado, jurássico, "cabeça de galinha" e por aí vai. Por aqui, ninguém
acusou Sarkozy de nada disso. Vai
ver que é por isso que a França é o
que é, e o Brasil também.
crossi@uol.com.br
Texto Anterior: Editoriais: Ondas perigosas
Próximo Texto: Brasília - Valdo Cruz: Sem derrotados Índice
|