São Paulo, sábado, 31 de julho de 2010

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Linha ocupada

Disponibilidade de recursos e alto interesse pelo Brasil mostram que projeto de "supertele" com dinheiro público é um equívoco

Consumada no início de 2009, a operação de compra da Brasil Telecom pela Telemar, dona da Oi, foi marcada por procedimentos nebulosos, que provocaram polêmica e justificadas apreensões sobre os interesses do governo Lula no setor. Patrocinado pelo Executivo, com o argumento de que seria necessário criar uma "supertele nacional", o negócio foi acertado à margem das regras vigentes, que foram mudadas posteriormente para torná-lo legal.
Até aqui, os resultados da nova companhia mostravam-se ruins para o consumidor. Com uma dívida estimada em R$ 30 bilhões, a Oi perdeu capacidade financeira e deixou de fazer investimentos necessários para expandir e aperfeiçoar seus serviços. Agora, a composição da empresa muda mais uma vez. Numa operação bilionária, a Portugal Telecom vendeu sua fatia na Vivo para a Telefónica e adquiriu 22,4% da Oi.
O novo sócio, é claro, não pretende ter participação apenas como investidor. Entra na empresa -que tem forte presença estatal por meio do BNDES e fundos de pensão- com o propósito de ser protagonista. Ao que se sabe, a PT terá poder de veto sobre decisões estratégicas da La Fonte (do empresário Carlos Jereissati) e da Andrade Gutierrez, os dois principais acionistas privados -que, segundo se especula, poderiam numa etapa futura sair da operadora.
As negociações, mais uma vez, contaram com a colaboração direta do governo. O presidente Lula e a candidata Dilma Rousseff, por exemplo, trataram do tema com o primeiro-ministro português. A ex-"supertele nacional" passou a ser a "supertele luso-brasileira", com ambições de ampliar suas atividades em escala internacional, notadamente nos mercados da América Latina e da África.
O alto valor envolvido na transação -R$ 27,5 bilhões- demonstra a atração que o mercado brasileiro exerce sobre empresas do setor. Estima-se que até 2018 o Brasil terá 160 milhões de acessos à internet e 272 milhões de números de celulares habilitados. Embora questionados na Secretaria de Direito Econômico, os pacotes que envolvem internet, TV e telefonia são vistos como um filão promissor pelas operadoras.
Diante da disponibilidade de recursos, do interesse despertado pelo país e da possibilidade de a Oi vir a ser controlada dentro de alguns anos por um grupo estrangeiro, é de perguntar por que motivo o governo Lula mobilizou recursos públicos e os embalou em ideais nacionalistas para ampliar a presença do Estado na telefonia. Lembre-se, a propósito, o plano de ressuscitar a estatal Telebrás para promover oferta de banda larga.
Enquanto isso, o setor público impõe custos tributários excessivos às operadoras; a Anatel não raro comporta-se como órgão de defesa de interesses das empresas; e os serviços que chegam aos cidadãos são caros e deficientes.
Não parece um objetivo defensável de "política industrial" o Estado atuar como empreendedor na telefonia. Há outras prioridades. Seu papel, salvo ações pontuais, deveria concentrar-se na regulação, com vistas a fomentar um ambiente competitivo, com a atração de novos "players", em benefício do consumidor.


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