São Paulo, Sábado, 31 de Julho de 1999
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A ARGENTINA E O MERCOSUL

O aparente êxito da diplomacia brasileira em convencer o governo argentino a sustar as barreiras às importações de produtos de seus parceiros no Mercosul não deve ocultar a persistência de uma cisão estrutural no interior do bloco econômico.
Brasil e Argentina encaram o Mercosul sob pontos de vista diferentes, e não exatamente complementares. Para o Itamaraty, trata-se de construir uma organização como a União Européia, capaz de ampliar os mercados e estimular o desenvolvimento de todos os países-membros. Em razão desse objetivo maior, de longo prazo, o governo brasileiro vem fazendo sucessivas concessões à Argentina, cuja economia tem sido, até agora, a maior beneficiária dessa disposição.
Já a Argentina parece ter um objetivo diverso, voltado basicamente para o curto prazo. Com a economia em sérias dificuldades devido à ameaça de grave crise cambial, o país sofre com a perda de competitividade da indústria, com os déficits comerciais crescentes e com um forte endividamento. O governo argentino vive hoje na tentativa de encontrar mecanismos para sobreviver à camisa-de-força do regime de câmbio fixo.
Diante da crise, o governo argentino age como se seus parceiros do Mercosul, e notadamente o Brasil, tivessem a obrigação de compensar os problemas decorrentes de sua crise econômica, absorvendo passivamente gigantescos déficits comerciais. As salvaguardas editadas na semana passada, se fossem implementadas, resultariam praticamente na liquidação do Mercosul. Mesmo agora, a situação permanece desequilibrada em favor do país vizinho. Acresce-se a isso a maneira como a Argentina usa o Mercosul, aparentemente como moeda de troca na política internacional, tentando a todo custo obter, principalmente dos Estados Unidos, vantagens econômicas em troca do seu, digamos assim, alinhamento diplomático. Veja-se, por exemplo, a infeliz tentativa da adesão à Otan.
Não cabe ao Brasil resolver os problemas internos da Argentina. O Mercosul não sobreviverá se atender apenas ao interesse de um de seus parceiros. Os custos econômicos que o Brasil vem suportando em nome da preservação da instituição não podem perdurar. O Itamaraty tem de buscar estabelecer limites. Ainda que o objetivo geopolítico de longo prazo seja louvável, ele não pode servir para justificar concessões sem fim.



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