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TENDÊNCIAS/DEBATES
Este é o momento de baixar os juros?
SIM
Uma aposta sem ônus
JULIO GOMES DE ALMEIDA
Nada está garantido, mas é notória a evolução do quadro financeiro na última semana, salvo pelo anúncio de mais um recorde da dívida pública
-o que já era esperado, em razão da escalada do dólar nos últimos meses.
As novidades estão no expressivo recuo do dólar e do risco Brasil e em um
início de queda das taxas de juros futuras. O Banco Central conseguiu rolar
quase toda a parcela da dívida pública
em títulos e contratos cambiais que venciam na próxima semana e a Petrobras
captou financiamento externo, após um
longo jejum de recursos de fontes internacionais privadas para o país.
Do lado da inflação, é evidente que o
quadro se deteriorou com a crise financeira. A inflação em 2002 ficará bem acima das previsões do início do ano, e a de
2003 será pressionada pela desvalorização cambial recente, através do canal de
transmissão do reajuste de tarifas indexadas. O que é importante sublinhar é
que esse agravamento do quadro inflacionário não decorre dos preços ditos
"livres", os quais não devem pressionar
adicionalmente a inflação, nem mesmo
na hipótese de que a economia volte a
crescer no próximo ano.
Em decorrência da retração de 2001 e
da estagnação vivida pela economia no
primeiro semestre deste ano, tendendo
a uma nova retração no segundo semestre, uma eventual recuperação econômica em 2003 partirá de um nível de atividade muito baixo e de uma acentuada
margem de capacidade de produção
não utilizada pela indústria.
Diante disso, o Banco Central poderia
exercer de imediato o "viés de baixa",
decidido na última reunião do Copom,
e reduzir a taxa básica de juros.
É uma aposta? É claro que sim, pois
não há garantias de que o quadro financeiro não venha novamente a se deteriorar. Trata-se, todavia, de uma aposta
que pode ampliar a melhora das expectativas e a redução das taxas de juros futuras, o que contribuirá para a redução
dos custos financeiros do setor público
e das taxas de juros ao consumidor. Por
outro lado, o ônus da medida em termos de um agravamento da inflação ou
da instabilidade financeira será rigorosamente nenhum.
Do lado real da economia, a redução
da taxa de juros poderia ajudar a deter
um processo que, a nosso ver, delineia-se de forma cada vez mais clara. As forças dinâmicas na economia estão se esvaindo em uma tal progressão que já há
ameaça de uma nova recessão. A queda
da renda real da população está contraindo o mercado interno consumidor;
o crédito caro e o temor do agravamento da crise financeira e do desemprego
levam até mesmo o consumidor de
maior renda a adiar as compras de bens
duráveis; a instabilidade financeira deprime ainda mais os investimentos; e a
queda das exportações não ajuda a
compensar a menor demanda interna.
Muitos analistas acreditam que uma
redução da taxa básica de juros hoje afetará a economia só daqui a seis meses,
ou até mais, mas isso não é verdadeiro
no plano das expectativas de curto prazo dos industriais e comerciantes.
Se essas expectativas forem levadas
em conta, podemos antever a influência
de uma queda da taxa de juros em um
prazo muito menor. Para que as expectativas de curto prazo sejam despertadas e operem a favor de um relançamento do crédito e da atividade econômica, não é necessário que os juros
caiam repentinamente, mas, sim, que os
empresários antevejam uma continuidade na redução dos juros no futuro.
Se assim for, a máquina das expectativas passa a operar e seus resultados poderão se traduzir em um aumento das
vendas e do consumo em prazo curto de
tempo. Prevendo uma melhora e o barateamento do seu próprio crédito, os
empresários da indústria estarão mais
dispostos, desde já, a ampliar prazos para os comerciantes, os quais, igualmente, estarão mais dispostos a aumentar os
prazos de pagamento nas vendas ao
consumidor, incentivando o consumo.
No plano das expectativas de curto
prazo, o processo se desenvolve, portanto, por meio da ampliação de prazos
das vendas, e não da redução da taxa de
juros do crédito bancário às empresas e
aos consumidores. As taxas bancárias
costumam demorar mais a reagir a uma
redução da taxa básica de juros .
Iniciar o quanto antes um processo de
redução dos juros e dirigir os maiores
esforços para não interromper essa redução inicial tem por objetivo despertar
as expectativas de curto prazo. É o meio
mais eficaz -talvez o único neste momento- de afastar o fantasma da recessão até o fim deste ano.
Julio Gomes de Almeida, 46, economista, é diretor-executivo do Iedi (Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial).
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