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TENDÊNCIAS/DEBATES
Este é o momento de baixar os juros?
NÃO
Política monetária e crescimento econômico
HUGO PENTEADO
Todos os fatores favorecem uma
redução de juros, mas a política
monetária precisa ser pautada pela credibilidade. Enquanto os eventos positivos já observados na economia não se
traduzirem em menor volatilidade do
câmbio, fica improvável uma redução
de juros. Mas isso pode acontecer em
pouco tempo.
Entre os fatores em prol de uma redução de juros, temos a melhora na balança de pagamentos, pois a necessidade de
dólares caiu de US$ 80,4 bilhões, em julho de 99, para US$ 43 bilhões (estimados), em 2002, e apenas US$ 39 bilhões
em 2003. O ajuste no déficit em transações correntes (bens e serviços) também é significativo: deve recuar de um
máximo de US$ 33,5 bilhões, em 99, para apenas US$ 13 bilhões em 2003, com
a previsão de uma balança comercial de
US$ 8 bilhões em 2002 e US$ 10 bilhões
em 2003.
Dois fatos muito importantes aqui
merecem ser mencionados. Primeiro, o
superávit comercial não se dá por causa
do enfraquecimento da economia, e
sim, em grande parte, em razão do processo de substituição de importações,
cuja economia é calculada em US$ 10 bilhões apenas este ano. Com o regime
cambial flutuante, desapareceu o estímulo para usar insumos produtivos importados, e esse processo é uma mudança estrutural.
Segundo, não é porque a taxa de câmbio nominal se depreciou que há o ajuste em todas as contas da balança de pagamentos, mas graças aos ajustes reais
no câmbio. Isso é mérito das boas políticas monetária e fiscal, que preservaram
a estabilidade inflacionária, melhorando a balança de pagamentos. Com isso,
a trajetória de depreciação nominal do
câmbio deverá ser revertida.
Essa trajetória do câmbio deverá fazer
a dívida pública recuar novamente de
61,9% do PIB, em julho, para 56%, em
dezembro deste ano. Com boas políticas monetária e fiscal, é impossível uma
trajetória de depreciação contínua do
câmbio, como também da dívida pública. Não há com o que se preocupar aqui,
mesmo porque esses avanços de política econômica estão bem sedimentados
hoje. Acima de tudo, depreciação nominal do câmbio qualquer país consegue,
já a depreciação real requer uma dose
de boa política econômica, e é exatamente este o caso do Brasil.
Além disso, com sinais de desaceleração na demanda, o Banco Central tem
espaço para reduzir juros até o final do
ano, tão logo o câmbio se acalme. A inflação não é uma preocupação, pois o
atual repasse da pressão cambial para os
preços tem sido muito baixo, por conta
de uma demanda fraca. A par disso, a
contribuição da alimentação, por ora
com uma pressão sazonal, continua
sendo positiva para a inflação dos 12
meses, a única que interessa para avaliar
as diretrizes de política monetária.
Mesmo com os juros mantidos altos,
cortando pressões inflacionárias eficazmente, é bom lembrar que não existe
contradição nenhuma entre o objetivo
da estabilidade inflacionária e o crescimento. A maior evidência empírica do
período pós-guerra revela que só há
crescimento econômico com inflação
estável (esta, por sua vez, depende também de uma boa política fiscal).
Passamos a maior parte do tempo discutindo o efeito das mudanças nos juros
sobre a atividade no curtíssimo prazo e
perdemos de vista a questão mais importante: choques inflacionários de curto prazo não são capazes de sustentar o
crescimento ao longo do tempo. A estabilidade inflacionária é, portanto, o motor de crescimento e, sem isso, com certeza, compromete-se o potencial de expansão das economias modernas.
Por isso é muito importante ter uma
política monetária a salvo de influências
externas. Não é a solução para todos os
nossos problemas, mas é, sem dúvida,
um excelente ponto de partida.
A função de reação dos bancos centrais pode ser beneficiada por ajustes,
como, por exemplo, o recente aumento
da meta inflacionária feito pelo Banco
Central europeu e, aqui no Brasil, com o
aumento da meta de 3,25% para 4% em
2003. A função de reação da política
monetária tem como variáveis o crescimento econômico e a inflação. Não
existe nessa função nenhuma relação
com os juros da dívida pública, mesmo
porque o Tesouro paga os juros que a
sua história determina, e não o que gostaria de pagar.
Por isso, para que os juros da dívida
pública caiam, não adianta contar com
a redução feita pelo Banco Central, pois
a única taxa que essa autoridade determina é a primária. As condições de devedor do Tesouro e a sua política de superávits fiscais primários irão assegurar
a queda nos juros pagos sobre a dívida
pública. Essa linha de raciocínio passou
por um longo processo de consolidação
e não está, muito provavelmente, sujeita
a reparos, garantindo um futuro promissor para nossa economia.
Hugo Penteado, 37, mestre em economia pela
USP, é economista-chefe do ABN Amro Asset
Management.
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