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Volkswagen: momento de impasse
JOSÉ LOPEZ FEIJÓO
O sindicato não perde a esperança. E, mesmo neste momento de luta, está aberto a um verdadeiro processo de negociação
NEGOCIAÇÃO. Essa tem sido a
meta batalhada pelo Sindicato
dos Metalúrgicos do ABC ao
longo dos anos, principalmente a partir do final dos anos 80, quando se desenhou um novo cenário de competitividade industrial. Nem sempre a via
para a negociação é fácil. Às vezes, para ela ser conquistada, é preciso resistência e muita luta na forma de greves
e até de passeatas. E para a negociação acontecer, é preciso garantir
equilíbrio entre as duas partes.
Não faltam exemplos da habilidade
de negociação por parte do Sindicato
dos Metalúrgicos do ABC.
Os acordos da Câmara Setorial do
Complexo Automotivo, de 1992 e
1993, foram frutos de nossa capacidade de organização e intervenção nos
fóruns tripartites, tendo como realidade a abertura indiscriminada à entrada de produtos importados, a estagnação no consumo e os riscos do
desemprego em massa.
Entre os vários resultados positivos
desses acordos, destacamos a retomada da produção e da venda de veículos
(de um patamar de 1.074.000 unidades anuais, em 1992, para 2 milhões
em 1993) e a conseqüente elevação da
arrecadação dos tributos.
O pontapé inicial para a fabricação
de carros populares foi dado a partir
da conclusão desses acordos, que ainda permitiram a recuperação do poder de compra dos trabalhadores, cuja renda aumentou 20%. Não podemos esquecer a conquista da manutenção dos empregos nesse período.
A atitude dos Metalúrgicos do ABC
de buscar a via da negociação para as
mudanças necessárias ou pretendidas pelas empresas tem, na prática,
dado às fábricas instaladas na região
um diferencial competitivo e seguro,
com acordos que vão da redução da
jornada à reorganização do tempo de
trabalho e implantação de novas formas de organização da produção, do
trabalho e da gestão.
Os acordos de participação nos lucros e resultados e as lutas por melhores salários têm injetado cifras significativas na economia do ABCD, terceiro maior pólo consumidor do país.
Com a própria Volkswagen, este
sindicato negociou no passado. Em
98, o setor automobilístico estava
mergulhado em uma crise. A multinacional alemã anunciou que tinha um
excedente de 6.500 trabalhadores.
Em negociação com o sindicato, foi
construído um acordo de estabilidade
de emprego até junho de 2001, o qual
gerou benefícios e sacrifícios para a
empresa e para o trabalhador. Este teve o posto de trabalho garantido, mas
precisou aceitar o banco de horas (no
lugar do pagamento das horas extras
até um certo número de horas trabalhadas) e o início da Semana Volkswagen (redução da jornada em razão da
diminuição da demanda do mercado,
o que implica diminuição do valor da
participação nos lucros e resultados).
No final de 2001, nova crise. Em outubro daquele ano, a empresa demitiu
3.075 trabalhadores. Depois de esgotadas as possibilidades de negociação
no Brasil, o presidente do sindicato à
época, Luiz Marinho (hoje ministro
do Trabalho), foi à Alemanha e construiu um acordo de estabilidade de
emprego com duração de cinco anos
(até 21 de novembro deste ano), o qual
incluía a garantia de novos investimentos na fábrica de São Bernardo.
As demissões foram revertidas e,
em, 2002, foi concluída a negociação
para a produção do Fox exportação
para a Europa, com produção integral
na fábrica da Anchieta (acordo que a
empresa não respeitou, porque passou a fazer parte da produção no Paraná). O acordo de estabilidade incluía benefícios e sacrifícios para todos os envolvidos.
Em maio deste ano, nova surpresa.
A Volkswagen anunciou a intenção de
demitir quase 6.000 trabalhadores
em três das cinco fábricas no Brasil
-intenção repetida em outros países
onde ela tem fábrica, já que o plano
faz parte de uma reestruturação produtiva mundial. No Brasil, a Volks divulgou que pretende diminuir uma
série de direitos.
O sindicato se reuniu durante 26
horas com a empresa e apresentou
uma contraproposta para cada ponto
defendido por ela. Todas foram rejeitadas. Para piorar a situação, na última semana, a Volks deu um ultimato
ao trabalhador: ou ele aceitaria 3.600
demissões e o corte de direitos ou a
empresa poderia demitir 6.100 empregados e até fechar a fábrica.
Mais uma vez, sindicato e trabalhadores optaram pela negociação. Dessa
vez, foram 33 horas de conversas que
se revelaram improdutivas. A empresa insiste no processo de demissão
anunciado e no corte de direitos, o
que impossibilita a construção de um
acordo equilibrado.
Tal intransigência pode significar a
perda de trabalho para mais de 106
mil trabalhadores, levando em conta
toda a cadeia produtiva. Com tudo isso, a Volkswagen pode ser responsável por retirar da economia quase 4,8
bilhões de reais. Mas o sindicato não
perde a esperança. E, mesmo neste
momento de luta, está aberto a um
verdadeiro processo de negociação.
JOSÉ LOPEZ FEIJÓO, 56, metalúrgico, é presidente do
Sindicato dos Metalúrgicos do ABC.
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