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RICARDO MELO
Nem banda nem música
Há cerca de um ano, nesta
mesma página, mas em espaço diferente, este articulista
bissexto escreveu: "A pior notícia para as pretensões oposicionistas saiu das planilhas do
IBGE, ao sacramentarem algo
de que já se suspeitava. Depois de ensaiar uma queda livre, a economia brasileira dá
sinais de vitalidade e capacidade de recuperação das
quais, diga-se de passagem,
nem o próprio governo desconfiava (...)".
Publicado em setembro
passado, acabava assim o artigo: "À oposição, que na falta
de programa próprio apostava
na crise para ganhar musculatura, não resta outra saída exceto providenciar algum discurso. Deixem-se de lado as
pesquisas feitas com tanta antecedência. Do jeito que as coisas estão postas, parece mais
fácil eleger até quem bisbilhota extratos de caseiros do que
ver algum José subindo a rampa do Planalto".
(À época, especulava-se
que o ex-ministro Palocci poderia ser uma alternativa no
caso de Dilma Rousseff não
decolar. Afinal de contas, variadas enquetes davam a José
Serra uma dianteira folgada,
de cerca de 30 pontos, sobre a
ministra pré-candidata.)
O resto da história é de domínio público. Um ano depois, as coisas estão "postas
do mesmo jeito". Mesmo com
desmandos políticos do governo petista, a economia confirmou sua vitalidade, enquanto
a oposição, PSDB à frente, provou-se campeã do vazio de
proposições e alternativas.
Qualquer doente é digno de
atenção e respeito, mas causa
vergonha alheia um candidato ao Planalto oferecer como
diferencial mutirões contra
varizes ou recorrer a favelas
postiças num país em que a
miséria habita cada esquina
(mesmo as de Higienópolis).
Tamanho é o desconcerto
que mesmo bandeiras inegavelmente justas, como a de defesa do sigilo fiscal dos cidadãos, não robustecem a oposição. Assim como não se vende
tucano por corvo, a tentativa
de repetir a "banda de música" udenista fracassa na crítica e nas urnas. Por falta de
banda, de maestro e, sobretudo, por falta de partitura.
Esperto foi Aécio Neves.
Quando percebeu que o barco
tucano adernava rumo ao fundo, tratou de saltar antes do
desastre. Nos últimos tempos,
sua plumagem tem trocado de
cor mais ou menos com a mesma frequência com que transita pela ponte aérea BH-Rio.
Se realmente emplacar o sucessor, como tem chances de
fazer, Aécio despontará como
principal liderança não diretamente vinculada a Lula.
Seus planos, bem como o
"percentual oposicionista" de
seu comportamento futuro,
são uma completa incógnita.
Muito vai depender não só de
Minas -dependerá também
do tamanho que o PSDB terá
em São Paulo após eleições estaduais mais disputadas do
que os tucanos esperavam.
RICARDO MELO é coordenador da Folha.com
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