São Paulo, terça-feira, 31 de agosto de 2010

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RICARDO MELO

Nem banda nem música

Há cerca de um ano, nesta mesma página, mas em espaço diferente, este articulista bissexto escreveu: "A pior notícia para as pretensões oposicionistas saiu das planilhas do IBGE, ao sacramentarem algo de que já se suspeitava. Depois de ensaiar uma queda livre, a economia brasileira dá sinais de vitalidade e capacidade de recuperação das quais, diga-se de passagem, nem o próprio governo desconfiava (...)".
Publicado em setembro passado, acabava assim o artigo: "À oposição, que na falta de programa próprio apostava na crise para ganhar musculatura, não resta outra saída exceto providenciar algum discurso. Deixem-se de lado as pesquisas feitas com tanta antecedência. Do jeito que as coisas estão postas, parece mais fácil eleger até quem bisbilhota extratos de caseiros do que ver algum José subindo a rampa do Planalto".
(À época, especulava-se que o ex-ministro Palocci poderia ser uma alternativa no caso de Dilma Rousseff não decolar. Afinal de contas, variadas enquetes davam a José Serra uma dianteira folgada, de cerca de 30 pontos, sobre a ministra pré-candidata.)
O resto da história é de domínio público. Um ano depois, as coisas estão "postas do mesmo jeito". Mesmo com desmandos políticos do governo petista, a economia confirmou sua vitalidade, enquanto a oposição, PSDB à frente, provou-se campeã do vazio de proposições e alternativas.
Qualquer doente é digno de atenção e respeito, mas causa vergonha alheia um candidato ao Planalto oferecer como diferencial mutirões contra varizes ou recorrer a favelas postiças num país em que a miséria habita cada esquina (mesmo as de Higienópolis).
Tamanho é o desconcerto que mesmo bandeiras inegavelmente justas, como a de defesa do sigilo fiscal dos cidadãos, não robustecem a oposição. Assim como não se vende tucano por corvo, a tentativa de repetir a "banda de música" udenista fracassa na crítica e nas urnas. Por falta de banda, de maestro e, sobretudo, por falta de partitura. Esperto foi Aécio Neves.
Quando percebeu que o barco tucano adernava rumo ao fundo, tratou de saltar antes do desastre. Nos últimos tempos, sua plumagem tem trocado de cor mais ou menos com a mesma frequência com que transita pela ponte aérea BH-Rio.
Se realmente emplacar o sucessor, como tem chances de fazer, Aécio despontará como principal liderança não diretamente vinculada a Lula.
Seus planos, bem como o "percentual oposicionista" de seu comportamento futuro, são uma completa incógnita.
Muito vai depender não só de Minas -dependerá também do tamanho que o PSDB terá em São Paulo após eleições estaduais mais disputadas do que os tucanos esperavam.


RICARDO MELO é coordenador da Folha.com


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