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TENDÊNCIAS/DEBATES
2005 deixará uma "herança maldita" para 2006?
NÃO
Mais fortes e mais seguros
ANTONIO PALOCCI FILHO
Em 2005 , o país cresceu em muitos
aspectos e se tornou mais forte e seguro de si. Está mais forte porque há três
anos o governo federal tem mostrado
que sua liderança pode dar condições
para as empresas e os trabalhadores
criarem um país que cresce com inflação baixa, contas públicas em ordem e
um setor externo em expansão. Além
disso, aprendemos que, ao decidirmos
não resolver problemas políticos relaxando os critérios de condução da economia, o país ganha e os problemas vão
sendo resolvidos na medida em que são
tratados nas instâncias próprias e com
respeito aos processos institucionais.
Do ponto de vista técnico, as condições para o crescimento econômico são
muito favoráveis nessa entrada de ano.
O ambiente externo é positivo e a significativa criação de emprego nos últimos
26 meses dá um impulso à demanda interna, que irá suplementar aquele dado
pelo aumento do crédito privado observado recentemente.
O crescimento do crédito privado, inclusive por meio dos mercados de capital, no qual o volume de debêntures
emitidas em 2005 mais que dobrou em
relação à média histórica, é uma das heranças boas de 2005 e um indicador de
como a economia brasileira amadureceu e começa a cruzar novos mares. Há
aí uma pequena revolução em curso,
com empresas e bancos tomando mais
riscos por si próprios, sem a intermediação do setor público, e os bancos
aprendendo a se tornar menos dependentes do financiamento do déficit público para se remunerar.
Aprendi que reverter o fenômeno da
expulsão do crédito privado pelo gasto
público (sugestivamente chamado de
"crowding out" nos livros de economia)
ajuda a diminuir as distorções da economia e incentiva o investimento. Pode-se, portanto, comemorar os sinais de
"crowding in" descritos acima, que são
resultados tangíveis da política econômica que o governo Lula tem seguido,
traduzida pela redução da relação dívida/PIB, queda sistemática e alongamento da curva de juros nominais de médio
prazo, além de outros elementos que
permitem uma economia se planejar e
investir com segurança.
Nosso compromisso fiscal para os
próximos três anos está inscrito na LDO
para 2006 e no compromisso do presidente seguida e publicamente reiterado.
Essa é a herança de 2005. A alguns, pode
parecer que ter de afastar novas dúvidas
sobre o nosso compromisso fiscal, depois de todo o esforço já feito, seja enxugar gelo. Mas isso é normal em qualquer
democracia.
O importante é entendermos os sinais
de confiança dados, por exemplo, pela
inédita emissão do BRL 2016 em setembro último. Trata-se de um título soberano denominado em reais e com dez
anos de prazo, cuja remuneração inicial,
de 12,75% (nominais!), já caiu para
12,5%. Essa é a transformação a que podemos aspirar e que ajudará a lidar com
muitos outros problemas do país. Virar
sem sobressaltos a página do nosso endividamento com o FMI e o Clube de
Paris é apenas mais uma outra evidência dessa tendência.
Há, entretanto, ainda alguns riscos e
várias áreas em que temos que continuar trabalhando para colher o que semeamos. Se as dúvidas sobre a questão
fiscal retrocedem cada vez mais -inclusive pela firmeza com que o governo
tem lidado com os complexos e candentes problemas da Previdência Social-,
deve-se reconhecer que as expectativas
de queda da taxa de juros ainda são
temperadas no curto prazo por interrogações quanto à sensibilidade dos preços a aumentos da demanda agregada.
Essa sensibilidade é o real significado
da distância entre o PIB e seu "potencial", sendo um dos maiores freios ao
crescimento sustentável e fator do custo
do combate à inflação. Acredito que, felizmente, esse risco está diminuindo, na
medida em que nossas empresas vão
abrindo seus horizontes e a concorrência regula o jogo dos preços.
Já colhemos benefícios da abertura
comercial -tendo o país se destacado
em 2005 pelo combate aos subsídios e
ao protecionismo. O saldo comercial
vem excedendo as expectativas mais
otimistas, tendo a participação do comércio exterior na economia dobrado.
Esse desempenho não foi homogêneo
em todos os setores, e o governo está
atento a isso. Mas o comércio tem facilitado a modernização das empresas e
contribuído para que 2004 e 2005 se tornem anos de criação de emprego e de
lucros recordes para o setor produtivo.
Como em 2005, o governo continuará
melhorando a qualidade dos impostos.
Finalmente, um importante legado de
2005 foi a conscientização da importância do controle e melhora do gasto público para diminuir o peso de novos aumentos da carga tributária sobre a sociedade e abrir espaço para o investimento público. Tenho convicção de que
essa herança se manifestará não só em
2006 mas também nos anos futuros. O
ganho de credibilidade é um processo
cumulativo. A persistência nas políticas
macroeconômicas que vêm sendo implementadas reforça a credibilidade e
abre espaço para a continuidade e aprofundamento das reformas estruturais
que aumentarão o nosso potencial de
crescimento.
Antonio Palocci Filho, 45, médico sanitarista, é
o ministro da Fazenda.
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