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CLÓVIS ROSSI
Uma ficção chamada Lula
SÃO PAULO - Almocei um dia, em
Havana (Cuba), com o presidente
da Casa das Américas, centro cultural do governo. O nome dele me escapa agora.
Na União Soviética, eram tempos
das reformas que pavimentaram o
caminho para o fim do comunismo.
Perguntei ao funcionário cubano se
seu país, por gosto ou por necessidade, não acabaria fazendo reformas idênticas.
Resposta: "Durante 70 anos, nos
disseram que a VERDADE era uma.
Agora, a VERDADE é outra. Quem
nos garante que, amanhã ou depois,
não nos venham a dizer que valia a
VERDADE original?".
Lógica perfeita, ainda que desse
margem a meio século de polêmica
semântico-sociológica que não levaria a lugar nenhum.
A frase do funcionário cubano me
volta à mente cada vez que vejo as
reviravoltas nos amores e idéias de
Luiz Inácio Lula da Silva.
A mais recente delas foi a confissão de que mentiu durante toda a
vida como dirigente sindical. Ou,
como ele prefere, viveu (e ganhou
prestígio) em função de uma ficção.
A frase integral é esta: "Na verdade,
o salário mínimo era uma peça de
ficção para discurso nosso no dia 1º
de maio".
Se criou uma ficção para fazer
carreira antes, quem pode garantir
que tudo o que disse e fez depois de
chegar ao poder não é também uma
ficção, o que talvez venha a ser reconhecido lá na frente?
Os comunistas pelo menos levam
uma vantagem sobre Lula: em lugar
da VERDADE original, puseram
outra VERDADE (suposta ou real,
não dá para discutir aqui e agora).
Lula, ao contrário, não pôs nada, rigorosamente nada, no lugar da ficção de fazer discurso pelo salário
mínimo.
A não ser o "maior prazer", como
também confessou no mesmo dia,
de vetar um reajuste mais suculento para os aposentados.
A ficção pré-poder era mais digna
que a nova verdade lulista.
crossi@uol.com.br
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