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'Eu não fui herói', disse cardeal sobre ditadura

CRISTINA GRILLO
DO RIO

A voz estava fraca, pausada; os passos eram lentos e as mãos, um pouco trêmulas. Mas as opiniões continuavam as mesmas que o levaram a ser considerado um dos membros mais tradicionalistas da alta cúpula da Igreja Católica no Brasil.

Às vésperas de completar 90 anos, em novembro de 2010, dom Eugenio Sales conversou por pouco mais de três horas com a Folha, uma de suas últimas entrevistas.

Riu -uma raridade- ao lembrar que durante a ditadura era acusado pela esquerda de se aliar aos militares enquanto ajudava perseguidos e refugiados políticos a saírem do país.

Estima-se que de 4.000 a 5.000 pessoas tenham recebido ajuda do então cardeal arcebispo do Rio para fugir.

"Eu não fui um herói. Cumpria o que devia cumprir, era minha obrigação. Era sincero na minha relação com o governo militar, e isso era fundamental naquela situação."

Contou então um caso para exemplificar sua relação com os militares. Um dia telefonou para o então ministro do Exército, general Sylvio Frota (1974-1977) e lhe disse: "Se você for informado que estou recebendo comunistas no Palácio [São Joaquim, sede da arquidiocese], saiba que é verdade".

Mas dom Eugenio sempre se recusou a aplicar a mesma lógica de amparar o diferente quando o tema eram os direitos dos homossexuais.

"Às vezes são irritantes essas passeatas gays. É promover uma coisa que não está correta segundo a natureza."

Até completar 90 anos, dom Eugenio ia todas as tardes para seu escritório, em um prédio da arquidiocese ao lado da Igreja Nossa Senhora da Paz, em Ipanema. Uma noite por semana participava de celebração restrita a padres na igreja de Santana.

Algumas vezes voltava tarde para casa, no alto do Sumaré, na Floresta da Tijuca. O caminho atravessa áreas dominadas pelo tráfico.

Muitas vezes cruzou com traficantes armados e aprendeu que o mais seguro é acender as luzes internas e apagar os faróis. "Eles conhecem o carro e escondem as armas. Às vezes me deparo com um homem morto. Mais de uma vez mandei parar o carro, desço e rezo por aquela pessoa. Algumas vezes os bandidos estavam perto, mas nunca se aproximaram", contou. "E também nunca tentei bancar o valente e repreendê-los."

Leia a íntegra da entrevista

folha.com/no1118230

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