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Questões de Ordem

MARCELO COELHO - coelhofsp@uol.com.br

Astúcias da defesa

Para provar a pequena culpa de Delúbio, coube ao advogado desconstruir tese de que houve um mensalão

PARECE ESTRANHA, de tão rudimentar, a opção do advogado de José Dirceu, inaugurando as alegações da defesa na sessão de segunda-feira.

A "prova dos autos", dizia Oliveira Lima, demonstra a inocência do réu. Afinal, pessoas como Lula, Dilma, o ministro José Eduardo Cardozo, além de deputados como Maurício Rands e Carlos Abicalil (todos petistas de carteirinha, como é óbvio), dizem que Dirceu não tinha tempo de cuidar das finanças do partido.

Evidentemente, declarações desse tipo não têm nenhum poder de convencimento.

Talvez exista um subentendido em tal linha de argumento. Se o Ministério Público não acredita nesses testemunhos, feitos sob juramento, irá então acusar Dilma e o ministro da Justiça de perjúrio?

Radicalizando: se vocês querem ser golpistas e desestabilizar a República, por que não vão até o fim?

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Por falar em radicalização, merece nota um argumento do advogado de José Genoino. Disse que o Ministério Público repete uma tese digna dos nazistas, dos tribunais medievais. Trata-se da "responsabilidade objetiva do réu".

Ou seja, tenha ou não feito alguma coisa, o réu é culpado pela sua própria condição, pelo fato de ser quem é. "Se é judeu, é culpado, e é culpado por ser judeu", exemplificou Luiz Fernando Pacheco.

No caso, José Genoino está sendo acusado não por algo que tenha feito, mas pelo mero fato de ser, na época do mensalão, presidente do PT.

Não tinha nenhum conhecimento das operações financeiras realizadas por Delúbio Soares; nunca entendeu disso.

Eis um ponto da defesa em que é possível acreditar. É usual que muitos políticos, mesmo sem o histórico de austeridade pessoal que cerca Genoino, deixem as tarefas mais comprometedoras nas mãos de quem conhece o assunto.

Mas há um fato, no processo, que foge dos argumentos do advogado. José Genoino assinou, ao lado de Delúbio, os papéis do empréstimo petista. Não está sendo acusado apenas por ser petista, por ser José Genoino, ou por qualquer outra coisa independente de sua vontade. Está sendo acusado porque tomou um empréstimo, dos mais suspeitos.

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Mais articulada, raciocinante e cheia de fatos foi a defesa de Arnaldo Malheiros. Para provar, não propriamente a inocência, mas a pequena culpa de Delúbio Soares, coube a Malheiros desconstruir a tese de que houve um mensalão.

Tudo teria sido apenas transferência (ilícita, sim, claro) de recursos de campanha.

Quem assistiu à sustentação de Malheiros continua, entretanto, com várias dúvidas.

Vem à baila a famosa questão do "ato de ofício". Ou seja, para que alguém com cargo público seja acusado de corrupção, tem de ter feito alguma coisa (o ato de ofício) em troca do dinheiro recebido.

O mero apoio ao governo por parte de deputados, diz Malheiros, não é ato de ofício. De resto, a acusação não especifica, réu a réu, no que votou, quando, em que sentido, nas deliberações do Congresso, para que se pudesse falar em "compra de votos".

Só foram 13 votos, acrescenta Malheiros; quantia insuficiente para assegurar a vitória em qualquer deliberação parlamentar. Mas isso, vale lembrar, não torna inocente quem recebeu e votou pelo recebido.

Outras pessoas, de diretórios estaduais, receberam dinheiro também, diz Malheiros, sem ter votos no Congresso.

Mas, novamente, o fato de alguns terem recebido sem ter votos não elimina a tese de que outros receberam exatamente porque tinham esses votos.

Resta assinalar que a coincidência entre recebimentos e votações foi contestada por Malheiros, e afirmada pelo Ministério Público. Eis uma discordância que precisa ser esclarecida com o máximo de precisão.

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