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Análise

Cansaço de ministros indica ritual obsoleto

Sustentações orais dos advogados deveriam ser diálogos esclarecedores, e não monólogos de verdades solitárias

A LINGUAGEM CORPORAL DOS MINISTROS NO JULGAMENTO DO MENSALÃO É INDICADOR DA URGÊNCIA DA MUDANÇA. NÃO É, POIS, DESCORTESIA NEM DESATENÇÃO

JOAQUIM FALCÃO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Imagens milhões de vezes acessadas em redes sociais mostram ministros do Supremo Tribunal Federal aparentando cansaço no julgamento do mensalão. Não são as primeiras, nem as últimas. Causam desconforto na opinião pública e neles próprios.

Por que os ministros estão tão cansados?

Muitos acreditam que seria desprezo com a Justiça, descortesia para com os advogados e, em parte, cansaço físico pela maratona de sustentações orais.

São argumentos que humanizam a justificação. Mas não explicam o comportamento. Reforçam a tese de que os votos já estariam prontos, o jogo estaria feito.

Seria um rito desprovido de poder real. Um STF como colegiado, onde os ministros se partilham dos mesmos fatos e argumentos, se somam nos debates, e juntos deliberam, seria quimera constitucional.

A causa do cansaço é outra. Os ministros estão estafados porque não têm nada a perder para a formação de seu juízo, ouvindo o que já leram nos autos.

Tudo já está digitalizado, acessível e disponível. Antes, durante e depois das sustentações que são repetições.

O modelo de deliberação do Supremo foi ultrapassado pelo progresso. Ainda exige transparência da presença física, quando a democracia quer outras transparências: do roteiro intelectual, da independência política e da responsabilidade moral.

O regimento do Conselho Nacional de Justiça permite que conselheiros façam perguntas aos advogados. Como o ministro Dias Toffoli tentou anteontem e Joaquim Barbosa ontem. A Suprema Corte americana também interroga advogados.

Sustentações orais deveriam ser diálogos esclarecedores entre ministros e advogados. E não monólogos de verdades solitárias.

Desembargadores também sofrem do mesmo problema. Mas os juízes de primeira instância, não. Nunca se viu um deles quase cochilando numa audiência, obrigados a comandá-las. Inexistem momentos processuais que os obriguem a ser apenas ouvintes passivos.

Nada impede que o ativismo processual da primeira instância chegue aos tribunais superiores e modernize o modelo de sustentações orais.

A linguagem corporal dos ministros é indicador da urgência da mudança. Não é, pois, descortesia nem desatenção. É antiguidade processual. Se perguntarem e indagarem, os advogados vão mudar também. Ganha a Justiça.

JOAQUIM FALCÃO é professor de direito constitucional da FGV Direito-Rio.

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