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OPINIÃO AJUSTE FISCAL
Timidez na área fiscal gera pressão sobre BC
Anúncio envergonhado de corte de despesas reforça dúvidas sobre a orientação da política econômica do governo
SÉRGIO VALE
ESPECIAL PARA A FOLHA
Apesar dos esforços do governo em fazer um ajuste fiscal, ele parece cada vez mais
envergonhado quando toca
no assunto.
O anúncio do detalhamento do corte feito esta semana
não ajudou a demonstrar que
o governo acredita de fato na
necessidade de uma mudança de longo prazo na condução da política fiscal e continua colocando sobrepeso
nas decisões que o Banco
Central terá que tomar sobre
o aumento da Selic.
Isso me faz lembrar de
Herman Melville, que criou
um dos personagens mais estranhos da literatura.
Quando demandado para
algum trabalho, Bartleby respondia com a mesma frase:
prefiro não fazê-lo. Mas, ao
mesmo tempo, parecia ser o
melhor dos trabalhadores,
porque ficava de segunda a
segunda no escritório.
O governo passa por uma
síndrome de Bartleby e o
ajuste fiscal é exemplo disso.
Muito se falou dele nos últimos dois meses, com várias
reuniões e muito suspense.
Um trabalho que parecia ser
extenuante de segunda a segunda. Mas, indagado sobre
fazer um ajuste fiscal forte, o
recado ficou parecido com o
personagem de Melville.
O anúncio de um corte de
R$ 50 bilhões no Orçamento
parece ainda uma carta de intenções, daquelas que escrevíamos à exaustão na década
de 80 para o FMI, para nunca
ser cumprida.
Os cortes redondos das
despesas obrigatórias sugerem a ideia de "chute" mais
do que análise criteriosa.
Os cortes nas despesas discricionárias deverão afetar
investimentos, apesar de o
governo negar. Cortes nos
Ministérios do Turismo e dos
Esportes me parecem um
compasso de espera para remanejamento de verbas para
a Autoridade Olímpica.
Muitos dos cortes foram,
na verdade, diminuição na
expectativa de crescimento
dos gastos, mas, ainda assim, serão fortes expansões
na comparação com 2010,
como na pasta das Cidades.
O que era para ser um detalhamento continua deixando incerto o que será a política fiscal em 2011. Aquele velho controle na boca do caixa
deverá dar o tom do ajuste.
Como um bom Bartleby, o
governo prefere não fazer o
que lhe é demandado e o resultado acabará sendo inflação acima da meta até o final
do governo Dilma.
SÉRGIO VALE, é economista-chefe da
MB Associados
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