São Paulo, quarta-feira, 08 de setembro de 2010

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Dilma teórica

Em artigos escritos na década de 90, quando presidia fundação no RS, petista condenava política de juros altos e câmbio valorizado , dois pontos criticados no atual governo

PLÍNIO FRAGA
DO RIO

A obra teórica da economista Dilma Rousseff, candidata do PT à Presidência, choca-se com a política econômica do governo Lula, da qual ela foi um dos pilares.
Em setembro de 1997, ao final do governo FHC, o país vivia um período de real valorizado e fragilidade nas contas externas (gastava mais do que recebia nas transações de bens e serviços com o exterior) -duas das críticas mais frequentes hoje no final do governo Lula.
Dilma presidia a Fundação de Estudos Econômicos do RS e produziu uma dezena de textos teóricos para a revista deste centro gaúcho.
Sem ter apresentado dissertação de mestrado ou tese de doutorado, esses artigos são raros exemplos do pensamento econômico da petista. Em artigo de 30 de setembro de 1997, Dilma comentou a sobrevalorização cambial e a fragilidade externa.
Começava reclamando da taxa básica de juros reais (então em 15,5% ao ano, descontada a inflação) e de que o governo tinha como política mantê-los altos, como faz o governo Lula -que mantém juros básicos anuais em linha ascendente, hoje em 10,75% (5,6% reais ao ano).
O artigo aponta que reservas cambiais elevadas com política de juros altos não asseguram garantias suficientes contra ataques especulativos -exatamente a argumentação do governo Lula para negar risco de uma crise cambial como a de 1999, que provocou uma maxidesvalorização da moeda.
Nos últimos anos, com a melhora da economia mundial, o Banco Central acumulou reservas internacionais próximas de US$ 260 bilhões. No entanto, o país voltou a ter deficit nas transações com o exterior, equivalente hoje a 2,2% do Produto Interno Bruto. Em 1997, o deficit atingiu 3,5% do PIB.
"O desfecho dos ataques especulativos no sudeste asiático mostra que nenhum dos instrumentos tradicionais, da elevação de juros à intervenção dos bancos centrais utilizando suas reservas e outros controles cambiais menos ortodoxos, é uma garantia integral contra um ataque especulativo, principalmente se houver razões de fundamento por trás dele", escreveu Dilma em 1997.
As reservas internacionais estavam em US$ 63 bilhões, recorde para a época.
"Comprovou-se (..) que a política monetária caracterizada pelos juros positivos, a existência de reservas elevadas e a presença de altos níveis de deficit externos tem uma limitada capacidade de ação diante dos volumosos fluxos especulativos de capitais, principalmente na vigência de câmbio relativamente fixas e valorizadas", diz a petista, no texto.
A diferença é que, àquela época, o câmbio era controlado e, hoje, flutua livremente. Mas, como antes, juros altos atraem capitais voláteis, de investidores que tomam recursos com custo baixo no exterior e aplicam no Brasil. O movimento valoriza a moeda nacional e prejudica a balança comercial.
Quando questionada sobre a atual fragilidade externa brasileira, Dilma declarou que o perfil da economia brasileira hoje é "mais saudável e robusto", pois o mercado interno está crescendo, e os empresários, investindo.
"A situação externa brasileira não é, de forma alguma, uma situação de pré-crise. A balança de serviços no Brasil mudou. Antes, era pagamento de juros e títulos de renda de fixa. Hoje, é investimento externo direto e aumento também da aplicação em Bolsa. O deficit tem outro perfil em relação ao deficit do passado", disse.
O economista e empresário Roberto Giannetti da Fonseca afirma que há semelhanças entre a situação de 1997 e a atual. Para ele, o deficit externo será a verdadeira "herança maldita" para o próximo presidente.
"Caminha de forma insustentável. Por exemplo, nunca na história deste país houve mais carros importados do que exportados. É uma drenagem de reserva que levará a uma crise cambial em 2013, 2014", diz Gianneti.


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