São Paulo, sábado, 09 de abril de 2011

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ANÁLISE

Método traz a realidade para dentro do gabinete do juiz

Cabe ao juiz escolher que instrumentos vão basear sua decisão

JOAQUIM FALCÃO
ESPECIAL PARA A FOLHA

O problema, aparentemente, é muito simples. O juiz deve decidir com base apenas no que está incluído no processo? Com base apenas no documento escrito com firma reconhecida? Na argumentação, nos fatos descritos e para as partes restritas nos autos? Ou o juiz pode levar em consideração fatos de que soube, informações que coletou, cenas que presenciou fora dos autos?
O procurador Ramiro Rockenbach de Almeida, de Mato Grosso do Sul, tenta resolver este problema de maneira peculiar. Já que o juiz, na maioria das vezes, não pode sair do gabinete, ir às ruas, falar com todos os envolvidos, não pode viajar para ver a realidade dos fatos, por falta de tempo e, às vezes, de condição, ele fez o inverso.
Trouxe a realidade para dentro do gabinete do juiz por meio de um filme que busca retratar, além da letra fria da lei, o conteúdo humano do conflito. Além dos pareceres formais, das provas documentais, a imagem vivida e a palavra falada, o sonho desfeito. Já que Maomé não vai à montanha, a montanha vem a Maomé.
Mas o que acontece quando a imagem do filme contraria os documentos? O perito assina que as obras financiadas estavam prontas e acabadas. A imagem nega. As casas estão sem telhado. O modelo de piscicultura não permitiu produzir nem um só lambari. O gado comprado para dar leite era doente, não produziu e morreu. Quem é o responsável? Quem tem que pagar os empréstimos? Ao juiz para decidir.
Do ponto de vista formal, são os lavradores que assinaram e são fiadores do empréstimo feito pelo BB. Assinaram o que não entendiam sem as informações necessárias. Sucumbiram à burocracia e a intermediários. O processo-filme alega que não havia condições mínimas para o livre exercício de contratar.
Mas contrataram. E agora? Ao juiz para decidir.
O filme faz parte da petição. Maneira engenhosa de trazê-lo legalmente para dentro dos autos. O filme é prova e fundamentação. O juiz não estará imune a ele. Basta ver para ser por ele influenciado, conscientemente ou não.
Haverá sempre juristas a favor do documento assinado. Mas hoje audiências já podem ser feitas por teleconferência. A Justiça pode ver mais. Mas como conciliar documento e documentário quando eles se opõem? Ao juiz para decidir.


JOAQUIM FALCÃO é professor de direito constitucional da FGV Direito-Rio.


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