São Paulo, domingo, 13 de junho de 2010

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ANÁLISE ELEIÇÕES 2010

Em nova sintonia, Serra atira em Lula

Pressionado por Dilma nas pesquisas, tucano relembra episódios nebulosos do governo

SERRA ELENCOU EXEMPLOS DO ANTAGONISMO DE SEUS VALORES COM O LULISMO: "NÃO DEVEMOS ELOGIAR DITADORES EM TODOS OS CANTOS"

FERNANDO DE BARROS E SILVA
COLUNISTA DA FOLHA

"O tempo dos chefes de governo que acreditavam personificar o Estado ficou para trás há mais de 300 anos. Luís 14 achava que o Estado era ele. Nas democracias e no Brasil, não há lugar para luíses assim."
Sabemos de que Luiz da Silva ele falava. Foi a primeira vez, desde o início da campanha, que José Serra atacou a figura de Luiz Inácio Lula da Silva, ainda que de maneira velada ao público. Foi a novidade mais importante num discurso, de resto, mais cheio de recados e farpas ao governo do que muitos no próprio PSDB esperavam.
Serra subiu o tom. Colocou fogo no conteúdo da sua fala. Mas, se o discurso ontem foi mais inflamado, o ambiente da convenção estava mais frio do que o que se viu no dia 10 de abril, em Brasília, quando o tucano anunciou sua candidatura a uma militância então sinceramente entusiasmada.
"Frio" talvez não seja a palavra. Tudo ontem parecia menos espontâneo e mais ensaiado. As pessoas uniformizadas, as bandeirinhas tremulando em sintonia -havia um clima de auditório na convenção tucana. A ponto de o mestre de cerimônias dizer, sem contrangimento: "Pode bater palma, você pode!" O aspecto mais simpático do show ficou por conta dos repentistas que anunciavam os oradores.
A aparência "popular" da festa tucana deve contrastar com o aparato cinematográfico da convenção do PT hoje em Brasília. O local escolhido ontem pelo PSDB -a quadra de esportes de um clube decadente na orla de Salvador- resultou num evento de estética pobretona, um tanto precário, quase mambembe. Com algum bom humor, pode ser visto como uma espécie de "Caravana Rolidei" em oposição à Holywood petista.

OGUM E VALORES
Serra aproveitou o palco de Salvador para homenagear Ogum, "guerreiro valente e orixá da lei". Foi a deixa que usou para elencar exemplos de antagonismo entre os seus valores e os que atribui ao lulismo: "Não devemos elogiar continuamente ditadores em todos os cantos"; o Congresso deve ser arena de debates, não "de mensalões e compra de votos"; a oposição "jamais deve sofrer tentativa de aniquilição pelo uso maciço do aparelho e das finanças do Estado".
Como em outras ocasiões, o tucano voltou a explorar a comparação entre a sua trajetória e a de Dilma: "Não comecei ontem e não caí de paraquedas. Apresentei-me ao povo, fui votado, exerci cargos, me submeti ao julgamento da população, fui aprovado e votado de novo".
Isso não é novo. Nova é a inclusão de Lula na linha de tiro do tucano, ensaiada ontem pela primeira vez. Não significa necessariamente que a campanha tucana agora será assim. Significa que Serra, pressionado pela subida de Dilma, está tateando, em busca de uma nova sintonia. O segredo consiste em separar o joio de Lula do trigo de Lula e convencer as pessoas de que ele -e não Dilma- cultivaria melhor o segundo. Não é fácil.


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