São Paulo, segunda-feira, 15 de agosto de 2011

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Herdeiro ou falsário?

43 anos após a morte de Chatô, homem aciona Justiça dizendo ser seu filho e pede parte da herança de R$ 1 bi

CRISTINA GRILLO
DO RIO
FREDERICO VASCONCELOS DE SÃO PAULO

Um novo personagem surgiu no fim do ano passado para tornar ainda mais complicada a divisão da herança do empresário e jornalista Francisco de Assis Chateaubriand Bandeira de Mello, o Chatô, fundador dos Diários Associados e morto em 1968.
Em 23 de novembro de 2010, Nilson Gomes Chateaubriand Bandeira de Mello, 60, entrou na Justiça do Rio, onde tramita o inventário de Chatô, para pedir sua inclusão entre os herdeiros.
Ele alega ser filho do empresário e quer que seja reconhecido seu direito a 25% dos bens a serem divididos, estimados em R$ 1 bilhão.
Os advogados dos descendentes do empresário dizem que Nilson falsificou os documentos apresentados à Justiça. Afirmam que seu pedido é uma "habilitação fraudulenta impressionante."
"Meu pai me chamava de Chatôzinho", diz Nilson, ao relatar, num modesto escritório de advocacia em São Paulo, fatos que afirma ter presenciado quando jovem.
Cita nomes de pessoas que foram próximas de Chateaubriand nos Diários Associados, no Masp (Museu de Arte de São Paulo) e na Academia Brasileira de Letras. Descreve detalhes da Casa Amarela, onde Chatô morou, no Jardim Europa, em São Paulo.
Nilson diz que sua mãe, Maria José Gomes Bandeira de Mello, trabalhava numa fábrica de televisores, em São Paulo, quando teve um "caso" com Chateaubriand.
O fato lhe teria sido contado pela avó, em 1960, em Alagoas. Diz que Maria José tem ódio de Chateaubriand. Por causa da religião -"hoje ela é crente", diz- sua mãe não confirma a paternidade.
Nilson se apresenta como jornalista, mas não tem registro profissional. Aparece em alguns documentos como engenheiro mecânico.
"Já cortei tijolo, entreguei leite, trabalhei em carvoaria. Hoje faço bicos como pintor e eletricista", diz. Pai de seis filhos, não tem residência fixa.
Mora em casa de parentes, em São Paulo. Durante vários meses, dormiu no escritório do advogado Juarez Bandeira de Lima, em São Paulo.
O advogado assinou o pedido de habilitação no inventário, mas deixou a causa. "A mãe dele me disse que ele não é filho de Chatô. Se ela diz isso, não sou eu quem vai duvidar", contou à Folha.
Advogados ligados à Congregação Cristã estudam a possibilidade de assumir o processo, a pedido de uma parente de Nilson.
O suposto herdeiro diz que foi procurado há alguns anos pelo jornalista e escritor Fernando Morais, que queria incluir sua história em "Chatô, o Rei do Brasil", biografia do empresário escrita por ele.
"Nunca soube de sua existência, nem nunca o procurei", afirmou Morais à Folha. "Mas conhecendo Chatô, que não podia ver um rabo de saia, a história é plausível."
Nilson visita com frequência o túmulo de Chatô, no Cemitério do Araçá. "Papai era um homem muito especial. Ele tinha um olhar em todas as direções, como também tenho. Pretendo dar continuidade à ideia dele", diz, ao relembrar a doação, em 1959, de 49% das ações do conglomerado a empregados.
Sobre as acusações de falsificação de documentos, diz que "isso é erro de cartório". "Querem me processar, mas não tenho medo de nada. Sou uma pessoa direita."

OS HERDEIROS
Em vida, Chateaubriand reconheceu três filhos.
Gilberto Francisco Renato Allard Chateaubriand Bandeira de Mello, 87, nasceu em Paris, filho da francesa Jeanne Paulette Marguerite Allard. Um dos maiores colecionadores de arte do país, Gilberto só foi reconhecido pelo pai aos 16 anos. Solteiro, tem um filho adotivo.
Fernando Antonio Chateaubriand Bandeira de Mello, que morreu em 1982, aos 55 anos, nasceu do único casamento de Chatô, com Maria Henriqueta Barrozo do Amaral. Teve dois filhos.
Thereza Acunha Bandeira de Mello Alkmin, 78, é filha da atriz espanhola Cora Acuña, por quem Chatô se encantou quando ela tinha 15 e ele, 41. Tem dois filhos.
"Quando Thereza soube dessa história, sua primeira reação foi dizer: "sempre esperei qualquer coisa do meu pai'", conta Leonardo Alkmin, marido de Thereza.

OS DOCUMENTOS
Levantamento feito pela defesa da caçula de Chatô revela a suspeita de fraude.
Na petição que apresentou à Justiça, Nilson anexou uma cópia da segunda via de sua carteira de identidade e de sua certidão de casamento. Em ambas, Francisco de Assis Chateaubriand e Maria José Gomes Bandeira de Mello aparecem como os pais.
Na carteira de identidade, expedida em Alagoas, consta que Nilson nasceu em 10 de maio de 1951 em Itararé (SP).
Mas no cartório da cidade não há registro de nascimento de Nilson Gomes Chateaubriand Bandeira de Mello. Há, porém, o de Nilson Bandeira Gomes, filho de Maria José Gomes Bandeira e de pai ignorado. A data é de 12 de maio de 1951, dois dias depois do nascimento do suposto herdeiro de Chatô.
Esse material foi levado à Justiça em junho. Agora, o processo de inventário está parado para avaliar a veracidade dos documentos.


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