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OPINIÃO
Estou Tiririca da vida!
HUGO POSSOLO
ESPECIAL PARA A FOLHA
No futuro dirão que os brasileiros de hoje eram tão
cruéis quanto os antepassados escravocratas, afinal não
damos voz aos analfabetos.
Aliás, é bom lembrar que somente alfabetizados podem
dividir as classes em A, B, C,
D, E...
Meu medo é que, no futuro
hipotético, o exemplo seja o
Tiririca. A vergonha do palhaço não é ser analfabeto,
mas usar seu talento para arrastar votos no joguete embromador.
De cara, escrevi aqui nesta
Folha que votaria nele, se
ele NÃO fosse candidato. Aí
seria um protesto.
As urnas eletrônicas tiraram o prazer de anular o voto
escrevendo uma frase indignada ou um palavrão. A tecnologia domesticou a rebeldia. Tudo tão politicamente
correto que tentaram calar
até os humoristas.
Voto nulo sugere uma heresia. Mas foram expressivos
no último pleito, chegando a
5,51% na votação para presidente. Por que ninguém fala
deles? Quantos serão anulados no segundo turno? Podem ser tão decisivos quanto
uma aliança com o PV.
Por que os letrados, oriundos da esquerda, que fizeram a democracia pós-ditadura ficam se engalfinhando
por causa das alianças à direita do outro? Parece um
reality show de picuinhas
pessoais.
Pela porta do fanatismo
passam todos os tipos de irracionalidades como preconceitos, desejo de calar o
outro, investigações alopradas, boatos etc. E resolver a
situação do país? Isso alfabetizados não se preocupam.
A imensa desigualdade
social vira pó e a TV só mostra obras maquiadas.
A propaganda, aquela que
oferece ideias, morreu. Vicejou a publicidade, a venda
de produtos. Os marqueteiros nos vendem qualquer um
de maneira tão surpreendente que talvez esses candidatos mal se reconheçam diante do espelho.
Eu, quando coloco um nariz vermelho, sei muito bem
de que lado estou. Não engulo o coronelismo e o populismo que fazem deste país um
curral, onde se ganha mais e
mais dinheiro à custa da falta
de educação dos miseráveis.
Não vou tripudiar sobre
um analfabeto abestado, até
por que ele não lerá esse artigo. E os que podem ler? Uma
geração vem de universidades que nos dão o preconceito de caretas que tornaram
Geyse Arruda uma celebridade da fazenda tropical. Nela
ou em Brasília, os porcos de
Orwell, se tornaram, no poder, tão parecidos com os
humanos que dão nojo.
Pode parecer piada, mas o
Tiririca desonrou o ofício dos
palhaços ao se tornar deputado. Eu queria que fosse
apenas uma palhaçada, mas
peço seriamente: senhores
candidatos à Presidência, fixem-se na vontade real de
que o nosso país seja de fato
melhor, politicamente alfabetizado.
HUGO POSSOLO, 48, é palhaço,
dramaturgo e diretor dos Parlapatões e do
Circo Roda. Autor do livro "O Palhaço-Bomba".
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