São Paulo, domingo, 26 de setembro de 2010

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Consultor liga esquema a contas no exterior

Parceiro de empresa diz que foi orientado a depositar em Hong Kong dinheiro para cobrir "dívida" de campanha

Empresário de Miami confirma reuniões sobre remessas em São Paulo, mas nega envolvimento político nos negócios

RUBENS VALENTE
FERNANDA ODILLA
ANDREZA MATAIS
DE BRASÍLIA

O esquema de favorecimento a empresas privadas que provocou a queda da então ministra da Casa Civil, Erenice Guerra, contava com duas contas bancárias no exterior para receber o dinheiro arrecadado com contratos de intermediação de negócios com o governo federal. A afirmação é do consultor Rubnei Quícoli, contratado pela empresa EDRB do Brasil para "fazer virar" um projeto.
As contas estão em nome de empresas em Hong Kong, região administrativa especial da China, e, segundo o consultor, foram indicadas para o depósito de R$ 5 milhões que seriam pagos ao grupo de lobby.
A empresa de energia solar EDRB do Brasil diz que deveria pagar o valor para ter liberado um financiamento no BNDES. Como a Folha revelou dia 16, a Capital, dos filhos da então ministra Erenice, intermediava o negócio.
O consultor Rubnei Quícoli, parceiro da EDRB num projeto de usina solar no Nordeste, e um dos dois donos da EDRB, Aldo Wagner, revelaram à Folha, há duas semanas, e-mails e uma minuta de contrato em que a Capital lhes pedia dinheiro para obter o financiamento.
Os e-mails foram enviados por um servidor da Casa Civil. A EDRB foi recebida em audiência oficial na Presidência da República, com a participação, segundo Wagner e Quícoli, de Erenice.
A denúncia levou à queda da ministra no dia em que foi divulgada pela Folha. Segundo os papeis, a Capital pediu R$ 240 mil em seis parcelas mais 5% sobre o total a ser liberado pelo banco. A EDRB pretendia obter R$ 9 bi do BNDES, em três parcelas.
Segundo Quícoli, a EDRB não fez os pagamentos, pedidos pela primeira vez em dezembro. As conversas entre eles, contudo, continuaram.
Entre fevereiro e março, segundo o consultor, o ex-diretor dos Correios Marco Antônio Oliveira levantou a necessidade de um pagamento de R$ 5 milhões que deveriam ser usados, segundo Quícoli, para cobrir "uma dívida" ligada à campanha da presidenciável Dilma Rousseff (PT). O PT negou e ameaçou interpelar Quícoli.
A Folha localizou uma testemunha de uma dessas conversas, que pediu para não ser identificada. Ela confirmou ter ouvido o pedido de R$ 5 milhões feito por Marco Antônio. O pagamento não foi feito, mas houve uma discussão sobre como isso poderia ser efetivado.
Num primeiro momento, como a Folha revelou, o grupo de lobistas ligado à Capital sugeriu a Quícoli um pagamento numa conta de outra consultoria de Brasília (a Synergy), no Banco do Brasil. Não houve acordo.

CONTAS EM HONG KONG
O que não se sabia é que, em maio, as conversas foram retomadas. Quícoli disse que Marco Antônio, tio de outro sócio da Capital, o advogado e ex-servidor da Casa Civil Vinícius Castro, sugeriu então uma segunda possibilidade: depósitos em duas contas em agência do banco HSBC na cidade de Hong Kong.
Segundo Quícoli, Marco Antônio lhe disse que poderiam ser usadas contas que estavam sob controle do seu genro, o empresário Roberto Ribeiro, que vive em Miami (EUA) e possui uma empresa exportadora de cigarros.
No dia 25 de maio, Quícoli disse ter recebido um e-mail com os dados das contas, em nome das empresas Right Day Enterprises Ltd. e Tartar International Ltd. A Folha confirmou em Hong Kong que elas de fato existem.
Quícoli também afirmou ter se reunido, em 12 de junho, com Ribeiro e Marco Antônio num hotel nos Jardins, em São Paulo. Na conversa, diz o consultor, novamente Marco Antônio teria falado de depósitos no exterior.
Localizado pela Folha, Ribeiro confirmou, por e-mail, que esteve reunido com Quícoli no hotel, a pedido de seu sogro, Marco Antônio. Contudo, Ribeiro negou ter ouvido falar sobre os compromissos de campanha. Alegou que as contas tinham relação com uma possível negociação pretendida pela EDRB.
"O que o Marco Antônio me pediu foi para me apresentar o sr. Quicoli, que ele tinha muitas oportunidades de fazer investimento no exterior e, como sou empresário nos EUA, seria de grande valia conhecê-lo", escreveu Ribeiro à Folha.
"Enviei as informações bancárias a pedido do sr. Quícoli, para o mesmo checar com seu banco a possibilidade de fazer negócios com uma ou outra. Em meu breve encontro no hotel, ele me disse que as empresas não "qualificavam" para que ele pudesse fazer qualquer tipo de negócio com as mesmas."
Ribeiro disse que as duas empresas de Hong Kong fazem negócios com ele, mas que as contas bancárias não são por ele controladas.
Depois de falar sobre negócios e depósitos em contas no exterior, Ribeiro entregou a Quícoli um cartão da Belcorp of America, registrada em nome dele na Flórida.


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