São Paulo, domingo, 28 de novembro de 2010

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"PT mudou a ponto de ficar quase irreconhecível", diz cientista política

Wendy Hunter, da Universidade de Austin (EUA), escreveu livro sobre transformações do partido

Para pesquisadora, Lula teve papel central na "normalização" da sigla, que inclui escolha de Dilma como candidata

UIRÁ MACHADO
DE SÃO PAULO


A cientista política Wendy Hunter, professora da Universidade de Austin, Texas (EUA), acaba de escrever um livro sobre as transformações por que passou o PT entre 1989 e 2009. Para ela, o partido "mudou a ponto de ficar quase irreconhecível".
Além de diferenças que ela chama de mais óbvias, como a moderação ideológica e as alianças que o partido atualmente faz ("inimagináveis há 20 anos"), Hunter menciona a própria candidatura de Dilma Rousseff à Presidência, uma "novata" na sigla.
Para Hunter, o presidente Lula teve papel central na condução das mudanças, mas ela não vê as alas radicais conquistando mais espaço no governo Dilma. A seguir, trechos da entrevista concedida por e-mail.

 

Folha - A sra. acaba de publicar um livro em que estuda as transformações por que passou o PT desde 1989. Quais as principais mudanças?
Wendy Hunter
- O PT mudou a ponto de ficar quase irreconhecível em relação ao que era na década de 1980. Um dos aspectos mais óbvios diz respeito à moderação ideológica, que pode ser percebida não apenas nos seus programas mas também em suas políticas de governo. As alianças que o PT faz hoje seriam inimagináveis há 20 anos. Tome como exemplo os dois últimos vice-presidentes: José Alencar (PL) e Michel Temer (PMDB). A atual posição do PT em relação ao PMDB mostra bem o quanto um processo de "normalização" ocorreu.

A eleição de Dilma Rousseff também faz parte desse "pacote" de mudanças?
Sim, é um ponto importante. O simples fato de que a candidata à Presidência neste ano foi alguém que ingressou no partido há pouco tempo -dez anos- é testemunha dessas mudanças. Além disso, há diversos candidatos que não vieram do sindicalismo ou dos movimentos sociais, por exemplo.

Lula foi a principal figura do PT durante todo esse tempo. Qual sua participação nesse processo de transformação? Lula teve um papel central na administração e na promoção de mudanças no PT. Transformações programáticas precisam encontrar apoio não só no eleitorado, mas também na legenda. Lula foi crucial ao encorajar o partido a ouvir mais o eleitorado e suas aspirações. Ao mesmo tempo, foi sensível às lutas e às dinâmicas internas do PT e soube conduzi-las de forma a apoiar um caminho moderado.

O que podemos esperar do PT durante o governo Dilma? As tendências mais radicais ganharão mais espaço? Acho que o PT está bem firme nas mãos dos moderados. Se olharmos as eleições internas do partido, veremos que não parece haver muito apoio às opções radicais, o que sugere que boa parte da base tornou-se moderada junto com os líderes. Os movimentos sociais também parecem bastante desmobilizados. Com a penetração de programas como o Bolsa Família, organizações como o MST já não conquistam adeptos como antes. Dilma, com suas tendências estatizantes, provavelmente não reduzirá o tamanho do Estado, o que encolheria os postos do partido.

As transformações foram positivas ou negativas? Um pouco de cada. De um lado, o sistema político perde por não ter um partido que se apegue à bandeira de um governo mais ético. Parece preocupante que a eleição de Dilma tenha se baseado tanto no uso da máquina pelo presidente Lula. Por outro, a transformação do PT se deu junto com e contribuiu para a consolidação da democracia no Brasil. O PT no poder continuou e aprofundou tendências de redução da pobreza e da desigualdade social. O ponto é: talvez um governo de esquerda mais radical pudesse ter feito mais, mas as conquistas da esquerda moderada serão mais sustentáveis.

FOLHA.com
Leia a íntegra da entrevista
folha.com.br/po837070



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