São Paulo, quarta-feira, 29 de setembro de 2010

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ELIO GASPARI

Chacrinha assumiu um pedaço do Judiciário


A balbúrdia da Ficha Limpa, a censura, mais a confusão do papelório, não explicam, confundem

FALTAM QUATRO DIAS para a eleição e pode-se temer que o glorioso Abelardo Chacrinha tenha buzinado uma ideia para alguns magistrados: "Eu vim pra confundir, não pra explicar".
A Lei da Ficha Limpa foi sancionada no dia 4 de junho deste ano. Um mês depois, o Ministério Público Federal ajuizou uma ação contra a candidatura do ex-senador Joaquim Roriz ao governo do Distrito Federal. Esse caso particular carregava consigo a discussão da constitucionalidade da lei, bem como sua aplicação neste pleito. O TRE de Brasília cancelou o registro de Roriz, seus advogados recorreram ao Tribunal Superior Eleitoral e perderam. Numa instância a decisão demorou 25 dias, na outra, 19.
Em setembro, Roriz levou o caso ao Supremo Tribunal. Foi julgado 20 dias depois e acabou num empate de 5 x 5. A eleição será domingo, e os cidadãos não sabem o destino que tomarão alguns de seus votos. Consumiram-se 64 dias, e nada.
Quem entende de lei são os juízes, mas a patuleia entende de calendário. Apressando-se o ritual da Justiça estimulam-se decisões sumárias, levadas pela emoção, mas há litígios em que a razão pede um julgamento rápido. Durante a desorganizada sessão em que o Supremo julgou o caso, surgiu a proposta de se esperar a indicação do 11º ministro por Lula. Embutia a decisão de não decidir. Se a lei é constitucional, como entendeu o Supremo, e se o recurso do ficha-suja não foi concedido (por conta do empate), quanto vale a decisão anterior do TSE?
Em 2000, num caso mais premente, o Judiciário americano deu a Presidência dos Estados Unidos a George Bush 34 dias depois de uma eleição contestada. Noutra, de 1971, a Corte Suprema derrubou em 17 dias a tentativa de Richard Nixon de censurar os documentos da Guerra do Vietnã conhecidos como Pentagon Papers.
Em Pindorama está acontecendo o contrário. Em abril de 2009, provocado pelo deputado Miro Teixeira, o STF mandou ao lixo a Lei de Imprensa da ditadura e decidiu que por cá que não há censura. Desde então, diversos magistrados proibiram os meios de comunicação de publicar isto ou aquilo. Os humoristas tiveram que ir à rua para defender seu direito de propagar o riso. Ou o STF acabou com a censura para inglês ver, ou há juízes que não acreditam na sua decisão.
A buzina do Chacrinha soou mais alto com a confusão estabelecida em torno dos documentos que o cidadão deverá levar à seção eleitoral. Desde 1965 a choldra sabe que convém levar o título de eleitor e, necessariamente, um documento de identidade com fotografia. Caso tenha esquecido o título, se o seu nome está listado na seção eleitoral, vota com a carteira de identidade. É isso que manda o Código Eleitoral. Uma lei do ano passado entrou para complicar: mesmo que o eleitor tenha a carteira com fotografia, precisa do título. Para quê? Se José Rousseff mostrou que é José Rousseff e seu nome está na lista de votação, qual a dúvida? Seguiu-se a lei básica da burocracia: em dúvida, complique. Os partidos políticos e a Justiça Eleitoral tiveram um ano para consertar o conflito. Faltam quatro dias para a eleição e ele ainda está de pé. Como diria o Velho Guerreiro, "o mundo está em dicotomia convergente, mas vai mudar".


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