São Paulo, quinta-feira, 30 de setembro de 2010

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JANIO DE FREITAS

O que o debate diz


Dos meses de campanha, não ficará nem sequer uma frase nem um instante distinto pela inteligência

O PRESIDENCIALISMO brasileiro, inspirado pelo presidencialismo fundador dos Estados Unidos, não desprezaria a adoção do confronto de candidatos à Presidência consagrado pelo debate entre Kennedy e Nixon -inovador e histórico cara a cara que nem na ambientação, costurada por tensões e golpes letais, diferenciou-se muito de um duelo vital de esgrimistas.
Mas, no Brasil, o confronto de candidatos à Presidência precisou esperar que os 21 anos de dominação militar se esgotassem e, recuperado o poder civil, terminasse o primeiro mandato presidencial da nova fase. Tempo bastante para que o molde americano se tornasse inviável aqui, por conspiração de dois fatores.
O primeiro deles foi a degeneração da política provocada por duas décadas de sua substituição pela força obtusa, que a reduziu a uma encenação de capachos bem recompensados e um punhado de resistentes manietados e silenciados. O segundo fator foi o advento com Collor e um americano importado, já na primeira eleição presidencial direta, do marqueteiro no lugar dos núcleos de assessoria política e técnica das candidaturas. O debate, que depende de conhecimento e de idéias, estava inviabilizado. Rebaixou-se a um encontro no nível da nova política, ou dos novos políticos, com rasteirices e as tais baixarias.
O fechamento da campanha se dá logo mais, com o "debate" dos mais ou menos presidenciáveis (ao menos na titulação) promovido pela TV Globo. A expectativa, ao que parece, mais comum é curiosa: supõe que Marina, a mansa, seja a desestabilizadora preponderante, sem distinguir entre as vítimas. Surpresa com isso, dadas as condições gerais, não haveria. Mas estaria extinta a exceção no presente e a promessa, para o futuro não distante, de uma presença inovadora nos níveis políticos influentes.
Mesmo que se aproxime da civilidade, o "debate" final não pode compensar o que o antecedeu. Foi uma campanha muito feia. Não só porque não teve nem um momento de grandeza sequer. Tudo foi chão, vazio, devedor. De tantos meses de campanha, não ficará NEM sequer uma frase, um slogan, um sinal de ação ou mesmo de um instante distinto pela inteligência. Se campanha prenunciasse o governo vindouro, o eleitor deveria ir em lágrimas para a urna.
Mas, com franqueza, a responsabilidade não é só dos candidatos e dos seus partidos. Vem de longe. Começou nas devastações e na incultura da dominação militar, e na profundidade com que as cravou na vida brasileira.
A parte negativa que cabe ao passado mais recente é acomodar-se naquele legado da ditadura. E até reforçá-lo em vários casos, como a qualidade da prática política. Nesse sentido, com o olhar para trás, é só ver o que foram a Câmara e o Senado na legislatura que logo se encerrará, na governança por medida provisória, nas alianças e nos escândalos do Executivo. Com o olhar para frente, é só ver o padrão médio dos candidatos que se oferecem para o Congresso.
Ao "debate", pois, tal qual pode ser.


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