Ribeirão Preto, Quinta-feira, 06 de Janeiro de 2011

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SP "reconhece" precariedade em canavial

Estudo do governo indica que boia-fria faz 17 flexões de tronco por minuto e perde oito litros de água por dia

Feito num intervalo de dois anos, estudo deve nortear projeto para melhorar condições de trabalho do setor


Edson Silva - 18.mar.10/Folhapress
Boia-fria corta cana para a Cevasa em fazenda de Restinga

HÉLIA ARAUJO
DE RIBEIRÃO PRETO

A cada um minuto trabalhado, um cortador de cana-de-açúcar faz 17 flexões de tronco, aplica 54 golpes de facão, deixa o joelho o tempo todo semiflexionado e estende a coluna cervical. Mas faz mais: corta e carrega em média 12 toneladas de cana por dia, percorre 8.800 m e, no final do dia, computa a perda de oito litros de água.
Os dados integram estudo da Secretaria de Estado da Saúde, com base em inspeções em 197 usinas de 144 cidades do Estado entre 2007 e 2009, que deve nortear uma regulamentação neste ano, para melhorar as condições de trabalho no setor.
"Reconhecemos que esses problemas existem há alguns anos e já trabalhamos para melhorar muitas coisas. Mas, mesmo que tardio, o diagnóstico vai ajudar a melhorar ainda mais o trabalho desses cortadores", disse a diretora da Vigilância Sanitária Estadual, Maria Cristina Megid.
Agora, segundo ela, é preciso normatizar as condições físicas e estruturais de trabalho dos boias-frias. O estudo mostra ainda que 40% da água fornecida para os trabalhadores beberem não atendem aos requisitos de potabilidade. Em cinco anos, ao menos 23 cortadores morreram supostamente devido ao excesso de trabalho.
Para especialistas, o reconhecimento do Estado quanto à precariedade nas lavouras é tardio, mas pode sinalizar um avanço na criação de políticas públicas.
Com base no estudo, um grupo da Secretaria da Saúde está elaborando uma normativa para disciplinar as condições sanitárias nas frentes de trabalho. Entre as principais normas estão a padronização da qualidade e distribuição de água e alimentos e a instalação de sanitários, refeitórios e locais de descanso. Ainda não há data para que seja cumprida.
As usinas dizem que, com a mecanização e o fim da queima da cana até 2017, os problemas devem diminuir.
O boia-fria José Cardoso Barbosa, 59, há 20 na profissão, não quer esperar tanto tempo. Ele, que chega a cortar 14 toneladas de cana por dia, disse que nas safras, em Dobrada, sente muitas dores na coluna e no braço esquerdo, usado para abraçar a cana a ser cortada.
Sua mulher, Eulina Soares dos Santos Barbosa, 55, boia-fria há dez anos, corta em média sete toneladas diárias. "Ela sente mais dores nos braços e coluna que eu. A idade vai chegando e, para ela, fica mais difícil ainda."
A diretora da Vigilância, no entanto, disse que a situação já começou a melhorar nos últimos anos. "Desde 2009, criamos critérios para que os alojamentos fossem adequados às necessidades. Isso já foi um avanço."


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