Ribeirão Preto, Segunda-feira, 10 de Novembro de 2008

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Mulher agredida denuncia e depois recua

Segundo a DDM de Ribeirão, 1/3 dos processos não seguem em frente porque a denunciante termina retirando a queixa

Construção de um abrigo pode ajudar a afastar a mulher do seu agressor, mas obra, que tem verba, está em fase de licitação

Edson Silva/ Folha Imagem
A dona-de-casa Helena (nome fictício), que já fez cinco boletins de ocorrência contra o marido

JULIANA COISSI
DA FOLHA RIBEIRÃO

Enquanto a Lei Maria da Penha se tornou um símbolo do avanço da luta para punir a violência contra a mulher, o medo e a falta de opção ainda fazem muitas mulheres voltarem atrás na luta por seus direitos.
Aproximadamente 1/3 dos processos judiciais que surgiram de uma denúncia contra o companheiro agressor são arquivados em Ribeirão Preto, de acordo com a DDM (Delegacia de Defesa da Mulher), porque há um recuo da mulher.
De acordo com a delegada Márcia Maria de Queiroz Cardoso, da DDM, a principal razão para a extinção desses processos é que as mulheres que denunciaram seus agressores se arrependem e pedem à polícia para que não levem o caso contra o companheiro adiante.
A vítima acaba se reconciliando com o agressor e volta para casa, na maior parte das vezes, segundo a delegada, por temor do marido ou falta de uma alternativa. "As mulheres que mais voltam à DDM são aquelas que pedem medida protetiva, mas depois voltam a morar com o marido. Muitas se reconciliam porque não têm para onde ir", diz a delegada.
Atualmente, dos 490 inquéritos sob investigação pela DDM, a maior parte é de casos de violência doméstica -os números incluem situações que envolvem também crianças e adolescentes. Para a delegada, a falta de uma casa para abrigar mulheres vitimizadas e seus filhos por um período contribui para que as mais indefesas voltem a morar com o agressor (leia texto nesta página).
"Se elas tivessem abrigo e cursos profissionalizantes, teriam mais independência e não seriam tantos casos [de desistência da queixa]", disse. Ribeirão conseguiu uma verba do Estado de R$ 300 mil para o projeto de um abrigo para mulheres vítimas de violência, que ainda está no papel.
Sem espaço próprio, a opção da prefeitura é abrigar a mulher e seus filhos na casa de parentes ou misturadas a mendigos e migrantes no Cetrem (Central de Triagem e Encaminhamento do Migrante, Itinerante e Morador de rua).
Há casos, ainda, de mulheres que mantêm as denúncias feitas. Mas tornam a apanhar e voltam à delegacia para registrar a nova agressão -que se torna um novo processo. E pior: ainda estão ligadas ao agressor.
É o caso de Helena (nome fictício), 35. Ela conta que já registrou cinco boletins de ocorrência por agressão do marido, mas ele, que mora com a mãe na casa vizinha, não sai de sua casa.

Cultura de agressão
Em cidades com abrigos próprios como refúgio para as mulheres, é menor a incidência de vítimas que voltam atrás e perdoam o agressor, segundo a deputada estadual Beth Sahão (PT), ligada à defesa dos direitos da mulher.
Para ela, entretanto, não basta só o poder público criar abrigo. "A prefeitura tem que estabelecer políticas públicas de proteção à família", disse. Como exemplo, cita Diadema, que limitou o horário de funcionamento de bares. A medida, segundo ela, fez com que diminuíssem as agressões, já que, em 60% dos casos de violência, o agressor estava alcoolizado.
Para a psicóloga Miriam Botelho Sargim, da USP (Universidade de São Paulo) de Ribeirão, a dependência do companheiro não é principalmente financeira. Segundo ela, em muitas casas, só a mulher trabalha e sustenta o marido.
"Elas dizem querer a presença masculina por causa dos filhos ou mesmo para não ficarem sozinhas", diz.


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