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154 ANOS ESTRANGEIROS
"Ribeirão me cativou de imediato", diz italiano
Tullio Santini saiu da Lombardia para construir a sua vida no Brasil
Imigrante aventurou-se no país após a guerra; cantina italiana é fruto do gosto pela culinária que ele herdou da mãe
DE RIBEIRÃO PRETO
Naquele pós-Segunda
Guerra Mundial, com a Europa arrasada, a única certeza
do jovem italiano de 20 anos
de Cremona, na Lombardia,
era que ele não queria construir a vida no próprio país.
Quando soube que um colega tinha se mudado para o
Brasil, Tullio Cesare Santini
não teve dúvidas: pediu emprego ao amigo em uma fábrica de picles, no Rio. Para o
Brasil, trouxe na bagagem o
gosto de cozinhar, herdado
da mãe e que só se tornaria
seu ofício décadas depois.
"Foi como que uma desculpa só para vir ao Brasil.
Não fiquei um dia na fábrica", conta Tullio, 75. Trabalhou como vendedor em uma
empresa italiana de móveis
de aço até se mudar para São
Paulo. Lá, o jovem italiano
atuou como vendedor de
roupas, mas sofreu com as
barreiras da língua.
Tullio conseguiu então
emprego como inspetor da
Liquigás para viajar para o
interior. Foi o passaporte para conhecer o Brasil.
Na sua peregrinação pelo
país, conheceu Ribeirão,
uma cidade tranquila como a
Cremona que havia deixado
na Itália. "A cidade me cativou de imediato pela limpeza, ordem, tranquilidade."
Em 1963, já casado e com
dois filhos, Tullio mudou-se
para Ribeirão. Decidiu abrir o
próprio negócio, a distribuidora Tullio Santini Gás.
A empresa existiu até os
anos 90, quando "um desejo
fundamental", como define
Tullio, surgiu em seu peito.
"Comecei a reviver um caminho perdido: o desejo de ser
cozinheiro", disse.
Até então, o italiano estava
acostumado a ser o cozinheiro de festas dos amigos e da
pescaria. Seu talento foi posto à prova. Tullio fez estágios
em restaurantes da cidade.
"Eu sabia fazer pratos para
dez, 12 pessoas. Mas outra
coisa é cozinhar para 50, 60
pessoas, e todos pratos diferentes", afirmou o italiano.
Em 1999, Tullio abriu o restaurante La Cucina di Tullio
Santini. Atualmente, sua
cantina é tida como uma das
melhores do país e é um estabelecimento citado em guias
de gastronomia de revistas.
A Ribeirão de 1963 ficou no
passado. "A mudança de Ribeirão reflete um pouco a do
Brasil, que não parou de crescer, e quase sempre de forma
desordenada. Hoje, há muito
carro. No meu tempo, era carroça", lembra Tullio.
Oriundo de um país mergulhado na história, Tullio vê
descaso com o patrimônio
cultural de Ribeirão. "Como
pode viver uma cidade se não
cuida de sua memória?"
O Brasil, seu país de coração, porém, não rouba o lugar da terra natal quando o
assunto é futebol e Copa.
"Vou torcer pela Itália, mas
se não der Itália, gostaria que
o Brasil ganhasse."
(JULIANA COISSI)
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