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154 ANOS PATRIMÔNIO
Em 30 anos, muita história foi destruída
Complexo da Cia. Mogiana, o Palacete Innecchi e o teatro Carlos Gomes são apenas três exemplos das perdas
Mentalidade destruidora pouco mudou; pressão de grupos econômicos é
a principal ameaça
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA,
DE RIBEIRÃO PRETO
O início da década de 1970
encerrou um período de 30
anos em que uma leva de
destruição de imóveis históricos em Ribeirão Preto sepultou de forma definitiva
parte importante da memória do município.
Da noite para o dia, literalmente em alguns casos, prédios, casarões, galpões e monumentos desapareceram.
A sanha demolidora, levada a cabo pela própria prefeitura -teoricamente interessada na remodelação da cidade- e mais por particulares, de olho no dinheiro que
chegava em forma de grandes edifícios e incorporações, mandou para o chão
ícones da arquitetura local,
marcos erguidos com a riqueza de diferentes épocas.
O complexo ferroviário da
Companhia Mogiana, o Palacete Innecchi e o teatro Carlos Gomes são apenas três
exemplos do que foi perdido,
não sem a anuência de grande parcela da população.
Parte do que resta entrou
em um processo de tombamento pelo Conppac (Conselho de Preservação do Patrimônio Cultural), órgão municipal criado em 1996, cujas
ações efetivas começaram
apenas em 2004.
Ao todo são 18 bens protegidos pelo município e outros cinco, pelo Condephaat
(Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico), de
âmbito estadual.
De tudo o que foi destruído, um caso, no entanto, pode ser entendido como a síntese de um pensamento que
ainda persiste.
Em 1986, os proprietários
do casarão Junqueira Lobato
não tiveram dúvidas em derrubar a imponente residência, na esquina das ruas Visconde de Inhaúma e Américo
Brasiliense, onde hoje está o
edifício Center Plaza.
Durante a madrugada providenciaram dois tratores e
uma corrente, que colocada
em volta do casarão a uma altura de pouco mais de 1,5 metro, foi puxada pelas máquinas. Em pouco mais de 15 minutos, a bela construção já
não existia mais.
Conta-se que quem passou
no local pela manhã não
acreditou no que via. Vizinhos que moravam perto
choraram ao ver o entulho
amontoado daquela que foi
uma das residências mais
charmosas de Ribeirão.
"Eles (os donos) não tiveram a preocupação de tirar
nem mesmo algumas peças
mais importantes. Foi tudo
destruído", disse o arquiteto
e urbanista Cláudio Baúso,
conselheiro e ex-presidente
do Conppac.
Quase 20 anos antes, precisamente em 1967, o símbolo de desenvolvimento de Ribeirão Preto também iria ao
chão. Depois de uma campanha contrária a sua preservação que durou anos, a estação da Companhia Mogiana
e todo o complexo ferroviário
que se estendia ao longo da
avenida Jerônimo Gonçalves
foram demolidos para dar lugar ao terminal rodoviário.
Sumiram a arquitetura inglesa de suas repartições, os
equipamentos, várias instalações, incluindo, em 1972, a
maior plataforma de embarque do Brasil, com mais de
250 metros de extensão.
No restante dos bens, o
pouco que sobrou em pé e inteiro e que já foi tombado não
está a salvo da destruição.
Prova disso está na rua Caramuru, 232, onde se encontra
um casarão tombado há 22
anos pelo Condephaat.
Desde 1988, a casa é o centro de uma disputa que envolve o Estado, a prefeitura e
os proprietários. Enquanto
nada se resolve, pouco vai
sobrando intacto do imóvel
construído em 1883.
A preservação do patrimônio histórico é prioridade
dentro do Ministério Público,
assegura o promotor Naul
Felca. À frente da Promotoria
do Meio Ambiente Urbano de
Ribeirão, Felca participou de
episódios onde o bem ameaçado, mais que um amontoado de tijolos, madeira e ferro,
era a própria memória dos
moradores.
Para o promotor, a pressão
de grupos econômicos representa a maior ameaça à preservação dos bens.
"Não há dúvidas de que a
questão de ordem econômica
se sobrepõe com muita facilidade a qualquer outra", disse
ele. "O patrimônio quase
sempre é jogado para um plano muito abaixo daquele que
merece", afirmou.
(PAULO GODOY)
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