Ribeirão Preto, Domingo, 21 de fevereiro de 1999

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GRAVIDEZ JUVENIL 2
Sem estudo,falta orientação a jovem
Escolas concentram orientação sexual

da Folha Ribeirão

As adolescentes que deixaram de estudar acabam à margem do único programa público de orientação sexual e, por isso, correm mais risco de ficarem grávidas.
A gestante "teen" tem o primeiro grau incompleto, é de família de baixa renda e não trabalhava quando descobriu a gravidez.
"As meninas ficam em casa e acabam grávidas antes das que estudam, geralmente pela própria falta de orientação", afirma o médico Wagner Lúcio Gueleri, coordenador do Programa de Atenção Integral à Saúde da Mulher.
No ano passado, das 1.535 adolescentes que tiveram o parto em Ribeirão e que moravam na cidade, 902 tinham o ensino fundamental incompleto -cerca de 58% do total de meninas gestantes.
Os dados estão em duas pesquisas divulgadas esta semana, uma feita pela prefeitura e outra pela Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo).
"Não é mais desinformação sobre o uso de preservativos, mas falta de consciência em relação ao comportamento", afirma Marta Angélica Iassi, coordenadora do Proase (Programa de Assistência e Saúde Escolar).
O Proase atende alunos de 4ª a 8ª séries da rede pública de ensino por meio de dinâmica de grupos e palestras sobre o tema.
"Longe do colégio, em geral, os amigos se tornam os principais conselheiros, papel que deveria pertencer aos pais", diz Marta.
A prefeitura, de acordo com ela, já estuda a ampliação do programa para as unidades de saúde que atendem nos bairros.
No ano passado, quase 10 mil alunos da rede de ensino participaram do programa -12% do total de estudantes matriculados no ensino fundamental.
Em 98, técnicos do Proase acompanharam um grupo de 16 adolescentes gestantes do Parque Ribeirão, zona norte, que estudavam até o início da gravidez. Depois, 12 deixaram os estudos.
"Passamos a analisar a hipótese de a adolescente engravidar para suprir uma carência afetiva", disse a médica ginecologista Marta Edna Holanda Diógenes Yazlle, responsável pelo setor de anticoncepção da Faculdade de Medicina da USP.
A nova tese surgiu do perfil da jovem mãe, que "não tem estudo, nem trabalho nem perspectiva de vida", afirmou a médica.
Para essas meninas, o papel de mãe representaria uma possibilidade de mudar sua posição social.
O perfil econômico das adolescentes foi medido pelo tipo de convênio em que ocorreu o parto.
Das gestantes cadastradas desde 92 em Ribeirão, cerca de 84% foram atendidas pelo SUS (Sistema Único de Saúde).

Experiência
Adilson Tiago de Souza, 15, e Cristiane Roseli de Oliveira, 14, namoraram menos de um ano. Na época, os dois não estudavam, nem trabalhavam.
Apesar de nunca terem falado sobre o risco da gravidez ou sobre métodos anticoncepcionais, os dois decidiram ter a primeira relação sexual. "Na hora, dá preguiça de sair para comprar camisinha", afirma o garoto.
Os dois terão o primeiro filho daqui há dois meses.
Depois da confirmação, o casal construiu um barraco na favela dos Campos Elíseos e pretendem sobreviver, por enquanto, vendendo latinhas que pegam na rua.
"A gente não se arrepende não porque agora somos uma família", afirma a garota.
Carla Aparecida Azarias, 17, usava preservativo com o namorado, mas um dia ele esqueceu a camisinha e a história do casal mudou.
Hoje, aos cinco meses de gestação, os dois se dividem entre as casas dos pais. Morar junto, segundo ela, só depois que tiverem emprego estável.
Carla seguiu o caminho do irmão mais velho, que casou aos 14 anos, depois de engravidar a namorada.
Sem revelar o motivo, a menina conta que parou de frequentar as aulas do supletivo e mudou seus planos de terminar o primeiro grau. "Quem sabe depois, quando meu filho estiver maior, eu volto", diz.
Assim que ficou grávida, Shirlley Aparecida da Silva, 19, perdeu o emprego de babá e deixou de lado o sonho de retomar os estudos.
"Pensei até em não ter o bebê, porque minha tia havia avisado que eu sairia de casa se tivesse filho. Mudei de idéia e vou morar com a minha mãe", afirma.
Shirlley diz que não pretende morar com o namorado, de 17 anos, porque estão sem emprego.
"Mudou muita coisa na minha vida por causa da discriminação. Não trabalho e agora dependo da família." (ALESSANDRO SILVA)


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