|
Próximo Texto | Índice
Premiar e punir
Nova York tenta choque de gestão em escolas ; diretores têm autonomia para gerenciar verbas e contratar professores, mas, se alunos forem mal avaliados, colégios podem até mesmo ser fechados
Gilberto Tadday/Folha Imagem
|
|
Alunos dançam em colégio do Bronx que está entre os 20% melhores de Nova York
ANTÔNIO GOIS
ENVIADO ESPECIAL A NOVA YORK
Quando o diretor Kenneth
Baum, 44, diz que é extremamente seletivo na hora de
contratar professores, convém levá-lo a sério. Que o diga Thomas Zavrel, 28, sabatinado por cinco horas antes
de ser aceito para o cargo.
A cena, rara até em escolas
particulares, ganha relevância por acontecer numa escola pública no Bronx, bairro
mais pobre de Nova York.
O que Baum procura em
horas de entrevistas não são
professores experientes. O
mais importante, diz, é ter
certeza de que serão receptivos a críticas e sugestões.
"Minha função é ajudar os
professores a fazerem um trabalho melhor. Podem ser
pessoas muito inteligentes e
preparadas, mas, se sentirmos que não estarão dispostos a conversar, não vamos
contratá-los", diz.
Isso explica por que sua
equipe é formada majoritariamente por jovens, quase
todos com menos de 30 anos.
A estratégia vem dando
certo. Mesmo com 92% dos
alunos (quase todos negros
ou latinos) incluídos em critérios americanos de pobreza, o desempenho em matemática colocou a escola entre
as 20% melhores da cidade.
Para entender como Baum
teve liberdade para apostar
numa tática ousada, é preciso considerar uma série de
mudanças que vêm acontecendo na cidade desde que
Michael Bloomberg, bilionário das telecomunicações, assumiu a prefeitura, em 2002.
Bloomberg deu a diretores
autonomia como nunca antes tiveram para administrar
verbas e contratar e afastar
professores.
Em compensação, todas
as escolas são avaliadas e
precisam mostrar resultados.
Se forem bons, há recompensas financeiras, inclusive bônus nos salários.
Em casos negativos, a escola pode ser até fechada,
destino já dado a 91 dos 1.600
estabelecimentos da rede. Os
alunos são então transferidos ou voltam a estudar no
mesmo prédio, mas com uma
equipe diferente.
RESULTADOS
Desde que as mudanças
começaram a ser implementadas, as taxas de conclusão
do ensino médio, após uma
década de estagnação, cresceram de 51% em 2002 para
68% em 2009.
Mas a pressão por resultados traz também efeitos indesejados. Nas escolas com fraco desempenho, professores
relatam um ambiente por vezes insuportável entre os diretores e a equipe, em que
uns jogam a culpa nos outros
pelo mau resultado.
Laura Stevenson, 27, por
exemplo, trocou uma escola
dessas pela de Baum, no
Bronx. "Faltava critério na
avaliação que era feita do
nosso trabalho. Não havia
orientação, apenas cobrança. Aqui, a gente sabe exatamente o que a direção espera
de nós, e as críticas são feitas
com clareza", diz.
Uma das queixas mais recorrentes à reforma de Nova
York é ter criado uma estratégia para fechar escolas ruins,
mas não para apoiá-las.
O secretário municipal da
Educação de Nova York, Joel
Klein, argumenta que a prefeitura deu instrumentos para os diretores controlarem
seus destinos.
"Várias ações são desenvolvidas antes de fechar, incluindo treinamento de professores e apoio de organizações contratadas para ajudá-los na gestão. Mas, em casos
crônicos, a melhor alternativa, para o bem dos alunos, é
fechar", disse Klein à Folha.
DEMISSÕES
A experiência de Nova
York mostra, no entanto, que
mais difícil do que fechar escolas é demitir professores.
A prefeitura aumentou o
quadro de advogados para
acelerar processos e tentou
uma medida radical: docentes com rendimento insatisfatório ou acusados de graves violações eram afastados, mas obrigados a comparecer a salas administrativas
onde não recebiam função
nenhuma.
Muitos jogavam cartas,
outros dormiam, alguns faziam ginástica para passar o
tempo, enquanto esperavam
seus processos serem julgados. Nos últimos dois anos,
no entanto, apenas três foram demitidos por incompetência, e 45 por má conduta.
Há 79 mil em atividade.
Diante da pressão cada vez
mais contrária da opinião
pública aos altos gastos com
professores que não faziam
nada, a prefeitura recuou e,
no mês passado, pôs fim às
salas, mas prometeu continuar os esforços para acelerar as demissões.
Para o diretor Baum, no
entanto, maus professores
nunca foram o maior problema. "A questão é o que fazer
com os que não são ruins,
mas também não são bons."
Ao mesmo tempo em que
Nova York discute como demitir, há a preocupação em
atrair talentos.
SALÁRIOS
Além de aumentar salários
em 43% desde 2002, a prefeitura aderiu ao programa
Teach for America (Ensine
para a América), que recruta
e treina jovens recém-saídos
das melhores universidades
do país para darem aulas por
dois anos em escolas de
áreas pobres.
Jonathan Munch, 23, é um
desses profissionais. Formado em administração no ano
passado pela Universidade
Estadual de Ohio, ele recusou ofertas para ganhar o dobro do que recebe hoje (US$
2.000 mensais).
"Às vezes, quando vejo minha conta, me pergunto se
foi a decisão correta. Mas,
por enquanto, quero trabalhar com crianças."
Os caminhos escolhidos
por Nova York para melhorar
a educação pública despertam interesse de educadores
em todo o mundo. Afinal,
ninguém foi tão longe na tentativa de adaptar um modelo
de negócios para a realidade
de um sistema educacional.
Na opinião de Henry Levin, titular da Faculdade de
Professores da Universidade
Columbia, ainda é preciso
mais tempo para avaliar melhor erros e acertos de
Bloomberg. "Apesar do barulho, as escolas tendem a seguir seu rumo, e as mudanças acontecem de forma mais
lenta", diz Levin.
Kevin Hesseltine, 35, professor há 12 anos na rede, reforça o argumento de Levin
com outras palavras: "Quando fecho a porta da sala, sou
apenas eu e os estudantes".
FOLHA.com
Leia mais sobre o
programa
www.folha.com.br/101414
Próximo Texto: São Paulo testa pontos da reforma feita em Nova York Índice
|