São Paulo, domingo, 02 de outubro de 2011

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'D.R.' NO CONSULTÓRIO

Pacientes reclamam de falta de atenção dos médicos nas consultas; profissionais se queixam da pressão e da falta de tempo para atender

MARIANA VERSOLATO
DE SÃO PAULO

Se houvesse uma "D.R." (discussão de relacionamento) entre médicos e pacientes, os últimos reclamariam que não são ouvidos da forma e pelo tempo que gostariam.
Segundo uma pesquisa publicada no "British Medical Journal", médicos interrompem os pacientes, quando estes fazem suas queixas, depois de 16 segundos. Outros estudos falam em 18 ou até 23 segundos.
É aquele tipo de consulta da qual a pessoa sai sentindo insatisfeita.
A professora de inglês Patricia Fernandes, 22, de São Bernardo do Campo, conta que, há seis meses foi a um médico que considera bastante experiente para tratar uma inflamação na orelha, que causou dores e febre.
Quando começou a descrever o problema, foi interrompida depois de dez segundos.
"Ele pediu que eu virasse o rosto para mostrar a orelha. Não se levantou nem se inclinou, não encostou nela, não disse o que poderia ser e sugeriu que eu fosse para casa esperar a inflamação passar."
Para ela, os médicos acabam entrando em "piloto automático. "Eles deixam de demonstrar interesse em ajudar", conta ela.
Já a dona de casa Celia Lessa, 61, de São Paulo, teve problemas em uma consulta com um neurologista renomado, ao qual levou seu pai, que tinha 83 anos na época.
"Fizemos todo aquele relato de doenças anteriores e disse que meu pai usava marcapasso. O médico anotava tudo, mas nem olhava para a gente. Falou que ia pedir uns exames, e um deles era ressonância magnética."
O problema é que ter um marcapasso é contraindicação para esse exame, e Celia só descobriu isso quando a enfermeira alertou para o problema, no laboratório.
"Foi falta de atenção, de interesse, e poderia ter causado a morte do meu pai."

OUTRO LADO
Os médicos, por outro lado, também reclamam de pressão e dificuldades para um melhor atendimento.
"Às vezes, o médico trabalha em condições insalubres, atende muitos pacientes por dia. Vira um trabalho escravo. Como se pode exigir um trabalho humanizado dessa forma?", diz Mario Alfredo De Marco, professor da Unifesp.
Para ele, que é psiquiatra, há problemas dos dois lados.
"Tem paciente que entra no consultório agressivo, irritado porque o atendimento é complicado, e outros até desafiam os médicos. E há profissionais que não gostam do contato com o paciente e atendem a toque de caixa."
Frente a esse conflito, a médica americana Wendy Schlessel Harpham escreveu o livro "Only 10 Seconds to Care: Help and Hope for Busy Clinicians" (Apenas dez segundos para cuidar: ajuda e esperança para clínicos ocupados, US$ 15,20 em e-book, na Amazon.com).
Segundo ela, o paciente pode conhecer mais sobre o dia a dia dos médicos, para entender por que o cuidado, muitas vezes, não é o ideal.
Os médicos podem descobrir jeitos simples de mostrar compaixão, além de ajudar o paciente a lembrar de detalhes que vão ajudar o diagnóstico. Ainda que só tenham dez segundos.


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