São Paulo, quinta-feira, 04 de novembro de 2010

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Normas atacam risco cardíaco da químio

Médicos criam diretrizes para tentar controlar problemas no coração causados pelo tratamento contra o câncer

Oncologistas e Sociedade Brasileira de Cardiologia preparam regras que serão publicadas em 2011

CLÁUDIA COLLUCCI
DE SÃO PAULO

Imagine sobreviver a um câncer mas descobrir logo depois que a quimioterapia causou danos ao coração e que você pode morrer por isso? Em torno de 10% dos pacientes oncológicos correm esse risco, mas até hoje não havia regras claras e reunidas em um só documento sobre como tratar os doentes.
O Brasil criou as primeiras diretrizes mundiais sobre o atendimento cardíaco a pacientes oncológicos. As normas estão sendo editadas pela SBC (Sociedade Brasileira de Cardiologia) e por oncologistas e deverão ser publicadas no início de 2011.
Os médicos vivem num impasse. Se, por um lado, alguns desses remédios são altamente eficientes no controle e no tratamento de diversos tipos de câncer, por outro, são tóxicos ao coração.
Um dos efeitos mais graves é a cardiomiopatia, que causa um enfraquecimento do músculo do coração e leva à insuficiência cardíaca e, em última instância, à morte.
Estudos internacionais mostram que os pacientes que passaram por tratamentos de câncer têm até 30% mais chances de desenvolver o problema do que a população em geral.
Segundo o cardiologista Ricardo Kalil Filho, um dos coordenadores das novas diretrizes, no documento haverá uma lista dos quimioterápicos que podem causar efeitos nocivos ao coração e as recomendações sobre como os médicos devem tratar esses pacientes.
Entre os quimioterápicos cardiotóxicos estão as antraciclinas e o trastuzumab, para tumores de mama.
"Estamos detalhando tudo. Tal droga causa infarto, a outra, insuficiência cardíaca e assim por diante", diz Kalil.
Ele explica que o médico será orientado a solicitar um ecocardiograma ao paciente dois meses depois do início da quimioterapia.
Se o músculo do coração apresentar deficiência, o cardiologista entra na jogada e, junto com o oncologista, define a mudança do remédio, a diminuição da dose ou a indicação de drogas que melhorem o músculo cardíaco.
"Todo dia vejo paciente oncológico com arritmia, infartando", diz ele, que atua no InCor (Instituto do Coração) e no Sírio-Libanês.
Para o oncologista Paulo Hoff, diretor clínico do Icesp (Instituto do Câncer de São Paulo), as diretrizes vão facilitar a vida do médico no sentido de orientá-lo a garantir o controle do câncer com menos chances de complicações cardiovasculares.
"Quando o câncer não tinha nenhuma expectativa de cura, você aceitava qualquer efeito colateral para prolongar a vida. Mas agora, com a possibilidade de cura, a gente tem que pensar em 10, 15, 20 anos para frente e tentar evitar ao máximo os efeitos cardiotóxicos", conta Hoff.
O ministro da Saúde, José Gomes Temporão, diz que o SUS será um dos grandes usuários das diretrizes, já que é responsável pelo atendimento de 80% dos tratamentos de câncer no Brasil. "Elas serão de muita utilidade na rede de hospitais", afirmou ele, em evento no InCor.


INTERESSE MUNDIAL
O interesse sobre os efeitos dos quimioterápicos no coração é mundial. Recentemente, a Universidade de Harvard anunciou que abrirá um novo programa cardio-oncológico para estudar as terapias mais indicadas no tratamento dos danos cardíacos.
Nos EUA, há outras iniciativas isoladas. Há três anos, um grupo de cardiologistas e oncologistas da Universidade de Minnesota abriu uma clínica com esse foco. "Desde que estamos trabalhando juntos, nenhum dos nossos pacientes apresentou sinais de insuficiência cardíaca", disse à Folha o cardiologista Steven Heifetz.
Ele afirma que vem usando medicamentos, como o Carvediol, para prevenir danos ao músculo cardíaco, mas reconhece que ainda é cedo para afirmar o efeito cardioprotetor a longo prazo.


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