São Paulo, domingo, 11 de outubro de 2009

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HISTÓRIA

O menor prematuro do Brasil

Aos três anos, o carioca que nasceu pesando 385 gramas na 25ª semana de gestação ainda surpreende os médicos por ter sobrevivido à prematuridade extrema sem sequelas físicas ou neurológicas

Luciana Whitaker/Folha Imagem
Arthur brinca em sua casa, no Rio; ele passou quatro meses e dois dias na UTI neonatal

CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL

A gravidez da carioca Ana Paula foi programada para que o bebê nascesse em novembro, um escorpiano como ela. Mas uma hipertensão materna, na 25ª semana de gestação, antecipou o parto em quatro meses. Arthur nasceu sob o signo de leão, o único do zodíaco de que a mãe dizia não gostar.
Considerado o menor prematuro do país e o quinto menor do mundo, Arthur nasceu em 4 agosto de 2006, com apenas 23 centímetros e 385 gramas -após o nascimento, chegou a pesar 282 gramas.
Seu pé media 3,7 cm, pouco mais do que o diâmetro de uma moeda de R$ 1. O dedo indicador do pai tinha quase o tamanho da mão do bebê.
O mais surpreendente para os médicos, porém, foi o fato de o garoto ter sobrevivido à prematuridade extrema sem nenhuma sequela, um fato raro.
Segundo o pediatra Ary Lopes Cardoso, do Instituto da Criança do Hospital das Clínicas de São Paulo, mais de 60% dos bebês que nascem com menos de 1,5 kg têm sequelas neurológicas em razão da prematuridade. Quanto menor o peso ao nascer, maiores as chances de problemas sérios.
Hoje, aos três anos, Arthur pesa 10 kg, mede 86 cm e tem desenvolvimento neurológico normal para a idade. "Não temos o direito de pedir mais nada a Deus", diz a mãe, a fisioterapeuta Ana Paula Carvalho, 31, que já trabalhou em UTI neonatal e conhece bem os riscos da prematuridade.
Foi em uma consulta de pré-natal de rotina que Ana descobriu a pré-eclâmpsia, causada por pressão alta e que pode levar à morte a mãe e o bebê.

O parto
Como havia sofrimento fetal, o parto foi imediato. "Apesar da surpresa, a gente teve condições de preparar o espírito. Pensávamos que, se fosse da vontade de Deus que o Arthur sobrevivesse, estávamos prontos para recebê-lo. Mas, se não fosse, também estávamos preparados para tentar uma nova gestação", lembra o pai, o representante de vendas Paulo Pinto da Costa Júnior, 36.
As 72 horas após o nascimento foram cruciais. "Foi no passo a passo mesmo. A primeira amamentação dele, por infusão, levou duas horas. E só foram 2 ml de leite. O intestino era muito fininho, uma coisinha de nada. Foi tudo muito lento. O pediatra diz que o Arthur criou uma nova régua de crescimento e desenvolvimento para prematuros extremos."
Ana Paula passava o dia todo no hospital. Ao chegar, por volta das 7h, avisava o filho que estava ali, contava histórias, cantava e rezava. Só saía do local após as 18h. "Ficar no hospital me deu muita segurança para, depois, cuidar dele em casa. Tirava o leite a cada três horas, dava banho, trocava as fraldas."
No período de internação, Arthur sofreu uma única intercorrência mais séria: a retinopatia da prematuridade, um crescimento desordenado dos vasos sanguíneos que suprem a retina (camada mais interna do globo dos olhos). Esses vasos podem sangrar e, em casos mais sérios, a retina pode descolar e ocasionar a cegueira.
Quando atingiu 1 kg, Arthur foi submetido a uma cirurgia para corrigir o problema. A rápida recuperação também surpreendeu os médicos. "Ele voltou do centro cirúrgico acordado, desentubado e com o olhão aberto. O anestesista até brincou: "Cara, seu filho tem uma missão'", lembra o pai.

Alta
Após quatro meses e dois dias de UTI neonatal na Clínica Perinatal Laranjeiras, no Rio, Arthur teve alta hospitalar. Pesava 2,1 kg. Antes, foi submetido a uma ressonância magnética para avaliar possíveis sequelas neurológicas. A neurologista não acreditou no resultado e pediu um novo exame.
"Ela falou: "Vou ser sincera com vocês. Não estava acreditando que ele não tem nada. Vocês têm que ajoelhar todos os dias e agradecer a Deus". E é isso o que eu faço. Agradeço a todo minuto", afirma Ana.
Arthur chegou em casa no dia 7 de dezembro. A data até hoje é comemorada como um segundo aniversário de nascimento.
Com um ano e três meses, o garoto começou a andar e a falar. "Mamãe foi uma das últimas palavras. A primeira palavra foi carro. Ele é apaixonado por carro. Depois foi Lucca [filho do primeiro casamento de Paulo], vovó, vovô, papai. Mamãe só veio depois de Kiki, a cachorrinha da avó dele, e do Flamengo. Mas tudo bem, tá valendo", brinca a mãe.
No início deste ano, o garoto passou a frequentar uma escolinha infantil. "Ele é uma figura. Já conhece todas as letras do alfabeto. Sabe que o "p" é de papai, o "t" é de tatu. Está faltando só mais um pouquinho para estar alfabetizado."
E, para completar a fama de garoto-prodígio, não é que o menino gosta de legumes? Brócolis é um dos preferidos. "O verrrde", como ele diz. "A única coisa que ele tem horror é de beterraba. Não tem santo que faça ele comer", conta a mãe.


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