São Paulo, sexta-feira, 18 de junho de 2010

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ANÁLISE

Medida é necessária, mas não basta para vencer a luta contra as bactérias

HÉLIO SCHWARTSMAN
ARTICULISTA DA FOLHA

A ideia de controlar melhor a venda de antibióticos não é nova. O Ministério da Saúde já flertou com ela em mais de uma ocasião, mas acabou recuando por motivos que vão do despreparo do SUS para lidar com o inevitável aumento da demanda à pressão de farmácias e laboratórios que não querem ver suas vendas reduzidas.
Em termos de racionalidade do sistema, porém, a medida é necessária, embora insuficiente, como explicou Helio Sader, professor de infectologia da Universidade de Iowa (EUA).
Para fazer sentido, ela deveria ser acompanhada de muitas outras iniciativas, como controle mais rigoroso da qualidade dos genéricos no mercado e, especialmente, novas rotinas hospitalares que promovam a antissepsia.
O propósito é evitar o surgimento de cepas de bactérias que não respondem a antibióticos. Essa é uma batalha vital em que estamos sendo derrotados. A capacidade dos micróbios de criar mecanismos de resistência é maior que a nossa de desenvolver novas classes de remédios.
O processo pelo qual micro-organismos desenvolvem resistência é complexo. Começa na comunidade, com o uso pouco criterioso dos antibióticos (inclusive quando receitados por médicos), e acaba nos hospitais, onde falhas humanas se somam a fatalidades biológicas para perpetuar colônias imunes às drogas conhecidas.
Ao tomar um antibiótico mal prescrito, o paciente acaba selecionando linhagens de bactérias com maior resistência natural à droga.
Genéricos que economizam no princípio ativo e doses menores do que as necessárias agravam o problema. Como as infecções típicas da comunidade não são muito graves, o fenômeno passa relativamente despercebido.
Um dia, entretanto, esse paciente vai parar no hospital, onde deixa exemplares de sua flora mais resistente. Bactérias, mesmo não aparentadas, têm a capacidade de trocar entre si fragmentos de DNA (plasmídeos), inclusive os genes responsáveis pela resistência. É nesse ambiente promíscuo que se forjam as superbactérias.
Esse fenômeno da resistência, presidido pela seleção natural, é a prova definitiva e às vezes fatal de que Charles Darwin estava certo.


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