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Guia vai ensinar médicos do país a dar más notícias
Livro a ser distribuído por toda a rede hospitalar foi criado pelo Inca e o Einstein
Lidar com fatos ruins e contá-los a doentes e parentes são rotina, mas faculdades não abordam essas questões
DENISE MENCHEN
DO RIO
Notícias difíceis na área da
saúde são o tema de um livro
preparado pelo Inca (Instituto Nacional de Câncer) e o
Hospital Albert Einstein.
A publicação é fruto de um
programa para melhorar a
transmissão de informações
sobre diagnósticos, recidivas
(reaparecimento da doença),
efeitos colaterais ou esgotamento de opções terapêuticas. Deve ser distribuído na
rede do Sistema Único de
Saúde a partir de novembro.
A coordenadora da política de humanização no Inca,
Priscila Magalhães, diz que,
apesar de fazerem parte da
rotina, más notícias causam
sofrimento a médicos, enfermeiros e outros profissionais.
Sem saber como lidar com
os próprios sentimentos, eles
passam as informações de
forma inadequada.
"O tema é pouco abordado
em faculdades. Na medicina,
em geral aparece apenas nas
cadeiras de psicologia médica", diz Magalhães. Segundo
ela, quando começam a trabalhar, "muitos não sabem
lidar com essas limitações e
as encaram como fracasso
pessoal".
As consequências desse
despreparo atingem tanto os
pacientes quanto os profissionais, que não raro desenvolvem problemas psicológicos, segundo Magalhães.
DEPRESSÃO
Estudo de 2009 feito pela
divisão de saúde do trabalhador do Inca mostrou que, dos
159 trabalhadores do hospital em licença, 32% tinham
histórico de transtornos
mentais ou de comportamento, como depressão.
Para minimizar o problema, o instituto criou uma oficina de qualificação. No ano
passado, foram treinados 120
alunos de hospitais federais
e universitários.
É a experiência dessa primeira turma que o livro relata. Até o fim do ano, serão
mais três turmas, num total
de 600 pessoas.
O projeto, financiado pelo
Einstein, foi viabilizado por
portaria que permite a hospitais de excelência destinar a
contribuição social que deveria ser recolhida ao governo a
projetos para o SUS.
A oficina começa em um
consultório fictício no qual
um médico é escolhido para
dar uma notícia. Atores representam o paciente e parentes. A cena é seguida pelos demais alunos através de
um vidro espelhado. Depois,
o grupo discute a forma como a conversa foi conduzida.
Nas semanas seguintes,
há a discussão de casos vivenciados. A equipe é apresentada ao protocolo Spikes.
A cirurgiã Patrícia Patury,
do setor de ginecologia oncológica do Inca, disse que o
curso mudou a forma como
ela conversa com os pacientes antes de uma operação.
"Aprendi a dosar as informações sobre riscos e benefícios", diz ela, que enfrentou
problemas por não ter apresentado os perigos de uma
biópsia a uma paciente que
surgiu com lesão na vagina.
"Ela já tinha tratado câncer de colo de útero e a lesão
podia ser indicativo de novo
tumor. Expliquei que era preciso fazer biópsia. No procedimento, a bexiga dela se
abriu numa fístula, que fez
com que a urina ficasse vazando", conta.
A paciente, revoltada, chamou o marido, que ameaçou
a equipe. "Eu tinha que ter
deixado claro para ela a possibilidade de isso acontecer,
apesar de ser raro."
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